terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Três mulheres plenas

Na peça Three tall women (Três mulheres altas), o dramaturgo norte-americano Edward Albee coloca as três personagens conversando em torno da cama de uma idosa à beira da morte. Tive mais sorte. Coloquei em torno da mesa de um bar a céu aberto três mulheres na plenitude de suas vidas, para falarem de suas trajetórias pessoais e da paixão delas pelo Teatro.
Flávia D’Álima, Lidia Sant’Anna e Thânia Rocha estão há dois anos em cartaz com a comédia dramática Jingobel (quem ainda não leu, leia). Depois de duas temporadas no Teatro Encena em 2009 e 2010, a peça segue agora pelo circuito alternativo. Elas se apresentam na próxima 5ª-feira, 17 de fevereiro, no Sarau da Vila Fundão (veja aqui).

Lidia Sant'Anna
Para Lidia Sant’Anna, moradora no Jardim Santo Onofre, Taboão da Serra, o teatro foi o “passo de libertação”. Seus pais – um caminhoneiro e uma dona de casa naturais do interior de São Paulo - não a deixavam sair de casa. Sua fissura pela dança se limitava a um ou outro festivalzinho na escola do ensino fundamental – o caminho para os bailes estava vetado. Mas na Igreja ela podia ir. Logo se enturmou com o grupo de jovens que atuava na Sexta-Feira da Paixão.
Dentro de sua própria casa, a menina Lidia era proibida de ligar rádio ou TV na Sexta Santa. “Era horrível. Me davam bronca até se eu sorrisse neste dia!”. Agiam como se o Cristo estivesse sendo velado na sala de visitas da família. Já na Igreja, antes ou depois do espetáculo, tudo era alegria. “O teatro da Igreja foi a minha alforria”, lembra Lidia às gargalhadas. Seu primeiro papel foi como um dos sacerdotes judeus inimigos de Jesus. Depois assumiu a personagem Verônica.
Com o passar do tempo, o grupo de jovens começou a montar peças fora do calendário católico. No espetáculo Um Barco Sem Pescador, a garota Lidia já estava no elenco principal. “Com 17 anos eu borbulhava teatro, enlouquecida por esta coisa de interpretar”. Ao assistir a peça Santuário de Vampiros, no teatro Cemur, em Taboão da Serra, cristalizou-se a decisão de ser atriz. “Cheguei a fazer dois testes com o diretor Antunes Filho”, relembra.
Mas chegou a idade de optar por uma faculdade, e fazer a difícil escolha. “Decidi seguir uma outra carreira que me desse condições financeiras de sustentar minha paixão pelo teatro. Por isto sou atriz como hobby”, diz Lidia, formada em administração de empresas, e funcionária de uma indústria química multinacional.

Thânia Rocha
Lembra do filme Flashdance, onde a personagem Alexandra Owens, vivida por Jennifer Beals, dança tão e demasiadamente que a gente fica até com câimbra nos olhos de tanto vê-la dançar? Quando a atriz Thânia Rocha era criança, era do mesmo jeito. “Por volta dos meus sete anos de idade eu deixava minha mãe doida de tanto que eu dançava”, relata Thânia. Ajudava na limpeza da casa dançando. Sentava à mesa para comer, dançando. Decorava as lições da escola para as provas... dançando. A saída foi colocar a menina no balé.
E foi nos passos da sapatilha que ela aportou no teatro. “Minha irmã era amiga de um pessoal que ensaiava teatro no CSU [Centro Social Urbano, no bairro Parque Pinheiros, Taboão da Serra]. Um dia precisaram de alguém para coreografar uma peça, e eu fui”. E ficou. Por 10 anos Thânia Rocha participou do grupo de teatro amador “Quem Diria?” fazendo coreografias e ajudando na produção. Seu começo como atriz se deu por acaso. “Certa vez faltou uma das atrizes principais. De tanto participar dos ensaios eu tinha decorado o papel, e encarei”.
Da mesma forma como achavam que Thânia tinha “problema de cabeça” pela dança na infância, o teatro virou “doença” na adolescência. “Meus pais reclamavam que eu não dava valor pra família, vivia teatro, dormia e comia teatro”. Para os irmãos, a coisa era mais séria: “Tá virando puta. Vê direito que essa menina tá virando...” diziam eles para os pais – um vigia e uma dona de casa nascidos no sul da Bahia.
Mas o que Thânia virou mesmo foi diretora e produtora de teatro. Procura manter esta paixão com empregos que não “atrapalhem” sua devoção. “Desde adolescente sempre procurei trabalhar em locais e horários que me permitam fazer teatro”. Se uma proposta de serviço não favorecer os horários, o teatro ganha a parada.
Thânia Rocha foi diretora da Paixão de Cristo, em Taboão da Serra, de 2000 a 2004.

Flávia D'Álima
Flávia D’Álima também é, literalmente, “duas em uma”. Trabalha desde os 18 anos, mas jamais sentiu satisfação em nenhum de seus empregos. “Só me sinto feliz no teatro. Tenho de trabalhar para pagar minhas contas, fazer meus cursos, mas minha única realização é no palco”, diz a atriz que acalenta o sonho de um dia viver somente do teatro e para o teatro.
Quando criança, a vida de Flávia já não era moleza. Sua mãe a buscava na academia de balé para levá-la ao curso de teatro. Entre uma atividade e outra, a menina fazia natação. “Sou artista por causa da minha mãe, ela é a culpada”, sorri. Seu pai taxista e sua mãe dona de casa vieram de Surubim (PE), terra natal do compositor Capiba e de Abelardo Barbosa, o Chacrinha.  Flávia tinha mesmo de ser artista, nénão?
Na Ação Comunitária [ligada à comunidade católica da região do Campo Limpo] Flávia conheceu seus primeiros colegas de teatro quando tinha entre nove e 10 anos de idade. Aos 14 anos integrou-se à Trupe Artemanha. Os ensaios eram no quintal da casa de Flávia, no Jardim Macedônia. Parentes e vizinhos foram sua primeira platéia. Em 1997, ligou-se ao Projeto Ademar Guerra, que originou a União Teatral Taboão.
O desenvolvimento físico e intelectual de Flávia seguiu a linha paralela entre o palco e o seu lar. Os pais viram a filha amadurecer conforme o figurino de suas personagens. Até algumas "peraltices" adolescentes eram reveladas no abrir das cortinas. "Meus pais foram me assistir numa peça onde minha personagem dava uma baforada imensa no rosto de outro personagem. No carro, de volta pra casa, meu pai comentou: 'Aquela tragada de cigarro é coisa de quem sabe muito bem o que está fazendo'... Foi assim que ele descobriu que eu fumava (risos)".
Desde o ano 2001 Flávia D’Álima desenvolve trabalhos junto à Cia de Teatro Encena, com quem assina a produção de Jingobel.

Para estas “três meninas” (é assim que as chamamos aqui na região) atuar em Jingobel serviu como “cura” para experiências teatrais frustrantes no período imediatamente anterior. Elas apostam na comédia como um meio eficaz de despertar no público, principalmente nas populações dos subúrbios, o gosto de ir ao teatro.
Graças ao seu formato (duração de apenas 50 minutos e cenário de fácil mobilidade) o espetáculo é adequado para encenações em escolas e empresas. A peça é recomendada para maiores de 14 anos.
Para contratar Jingobel:
fone: (11) 8336-0546

4 comentários:

Binho disse...

Sorte que a peça que elas estão fazendo não é " Três mulheres altas", senão, a Lídia não poderia participar, rsrsrsr
A peça Jingobel é muito engraçada e as meninas são ótimas.
Suzi

Flavia D'Álima disse...

Ía ser Suzi, mudamos por causa dela.
Mentira rsrsrsrs

Davi, obrigada de novo.
Você sempre gentil com nosso trabalho. "Se todos fossem no mundo iguais a você" já seríamos ricas e famosas rsrsrs

belo disse...

ouvi varios comentários bons sobre a peça e do trabalho das meninas também, não fui assistir ainda, mas quinta feira estarei lá na fundão pra conferir, SAÚDE E SUCESSO.

Jussanam disse...

Parabéns para as meninas de Jingobel, muito bom ler sobre a trajetória delas e sobre o sucesso da peça.
Bjs,
Jussanam