sábado, 6 de agosto de 2011

Saudades do Jorge

Vão falar hoje um bocado sobre o escritor Jorge Amado.
Faz 10 anos que “ele foi-se embora”, como se diz lá na sua amada Bahia.
Aqui no blog não vou escrever nada sobre Jorge hoje, não.
Vou deixar pra 4ª-feira, 10 de agosto, dia em que ele nasceu.
Escritores não morrem...
Só pra não passar batido, e pr’ocê ver como minha cabeça à toa funciona, confesso ser impossível lembrar Jorge Amado sem pensar na estonteante Sonia Braga, minha deusa das telas eletrônicas e das páginas das revistas.
A Sonia que emprestou suas curvas colossais para encarnar Dona Flor, Gabriela e Tieta, personagens imortalizadas por Jorge Amado.
A Sonia Braga que faltou só um tiquinho de nada pra eu vê-la em carne e osso e sentir-lhe o perfume. Não gosto nem de lembrar.
Eu já escrevi sobre isto na crônica O padre, a Sonia Braga e eu. Pra quem não leu na época em que contei este caso, reproduzo abaixo uma das passagens mais frustrantes da minha vida vadia.

O padre, a Sonia Braga e eu
(publicado em 22.ago.2008)

Não gosto de lembrar este assunto. Me constrange, me deprime, irrita... Só vou puxar esta conversa por causa da falta de criatividade de uma revista de mulher pelada. Botaram uma destas bonitinhas atuais da Globo a imitar Sonia Braga, na célebre cena onde Gabriela Cravo e Canela se encarapita no alto dum telhado para resgatar uma pipa.
Querer imitar Sônia Braga é erro capitulado como pecado grave no meu manual de profanações mundanas.
O episódio da foto-imitação destampou o garrafão onde conservo minhas memórias.
Por volta de 1983/1984, o fotógrafo Jorge, o engenheiro químico Fred e eu calejávamos nossos cotovelos no balcão do Bar Tordilho, na Avenida Vital Brasil, ao lado da casa e estúdio fotográfico de Jorge no bairro do Butantã.
Numa fatídica 2ª-feira o fotógrafo recebeu o telefonema de um padre amigo. O santo homem nos convidava para um churrasco de carneiro regado a vinho. O padre (não declino o nome dele nem que ressurja a Santa Inquisição) havia sido transferido da Igreja do Largo de Pinheiros para a Pompéia. A transferência compulsória se deu pelo motivo banal do consagrado homem de Deus gostar de conhecer intimamente as mocinhas e as senhorinhas da sua paróquia... Besteira, nénão?
Lá fomos nós rumo à Igreja da Pompéia. O padre nos recebeu com a cumplicidade de velhos camaradas. Ele era um polonês muito bem versado na sábia dosagem do catolicismo com o hedonismo.
Fred, Jorge e eu só abandonamos a sede daquela paróquia tarde da noite, quando os tanques de reserva das nossas carcaças não comportavam mais um milímetro do abençoado vinho.
Nossa preocupação era pegar o Tordilho ainda aberto para a cervejinha digestiva. Quando faltavam só mais umas seis cervejas pra gente pedir a saideira, entrou no boteco Ruth, mulher do Jorge.
Preparamos os ouvidos pra levar bronca. Ruth é uma mulher bela e belicosa. Mas... ela vinha sorrindo!!!
“Sabe quem ficou até agora lá em casa, esperando vocês chegarem?”, Ruth indagou.
Diante do silêncio estúpido do etílico trio, a mulher cravou nos cavalheiros de triste figura um piedoso “Já volto. Preparem-se pro pior...”
Retornou com uma foto da atriz Sonia Braga abraçada aos filhinhos do apalermado Jorge.
“Uma mulher tocou nossa campainha por volta das nove da noite”, principiou Ruth, “e eu disse lá de cima [a casa era assobradada] que não tirávamos foto naquele horário. Daí a mulher riu e disse que era a Sonia Braga. Eu disse pra ela que eu era Napoleão. Ela riu mais ainda, falou mais algumas coisas gargalhando, e eu reconheci a voz dela”.
Neste ponto do relato Jorge, Fred e eu já estávamos prontos pra chorar. Só não abrimos o berreiro devido à evaporação instantânea de todo o vinho e cerveja das nossas carcaças.
Ruth prosseguiu impiedosa com a sessão de tortura: “A Sonia Braga me falou que quando era mocinha, morou na mesma casa onde moramos hoje. E o quarto dela era exatamente onde hoje a gente usa como laboratório pra revelar as fotos. Daí eu bati uma foto dela com as nossas crianças, e fiz a revelação na hora, com a ajuda da própria Sonia Braga”.

Arrasados, os três patetas nos arrastamos do bar até a sala onde a deusa ficou por duas horas conversando com a dona da casa e as crianças. “A Sônia (reparem como Ruth já tratava a musa esplendorosa com uma intimidade que nos destroçava) disse que ia a uma festa, mas que tinha tempo de sobra. Eu falei que vocês vivem comentando dos filmes dela, e ela disse que ia dar um tempinho pra ver se vocês chegavam”, continuava Ruth. “Mas eu acho que pra vocês foi melhor encher a cara lá com o padre, do que chegar cedo e ver a Sonia aqui na nossa sala”. Cada frase dela era uma espada em chamas nos nossos ouvidos.
Contemplamos tontamente a poltrona onde Sonia Braga esteve sentada. Não tivemos coragem de nos aproximar. “Ela sentou ali mesmo naquela poltrona?”, perguntamos com aflição de náufragos. Ruth riu. Limitou-se a nos lançar na cara um sorriso onde se lia a palavra “trouxas”, e foi pro quarto, dormir.
Quando a mulher de Jorge se retirou da sala, arremetemos com fúria em direção à santificada poltrona. Passamos as mãos ávidas sobre o assento, à procura de algum fio de cabelo deixado pela estrela. Apalpamos com devoção o local que acolheu as divinas ancas. Cheiramos com agonia o tecido da poltrona, em busca de algum restinho do perfume, dos doces odores da deusa Sonia. Rastejamos pelo chão à cata de algum vestígio, uma mísera marquinha das sandálias dela... e nada.
Partimos com cólera para o laboratório. Ali tempos atrás Sonia Braga dormiu. Aquelas paredes testemunharam a intimidade da deusa quando ainda era uma mocinha em flor.
Desnecessário dizer o estado lastimável em que ficamos os três em pé, aturdidos, desanimados no escuro da nossa solidão.
Meses depois, Fred, Jorge e eu íamos para mais uma noite de trabalhos forçados de halterocopismo no Bar Tordilho, quando encontramos o ator Lima Duarte caminhando pela Avenida Vital Brasil. Ele queria comprar uma gravata. “É que eu vou encontrar com uma dona daqui a pouco, uma bonitona lá do Morumbi, e quero chegar com uma gravata bem bonita”, contou o ator. Fizemos a japonesa do bazarzinho próximo abrir a porta de aço só para atender Lima Duarte.
Contamos a ele a nossa desventura com Sonia Braga. Lima Duarte riu da nossa desgraça, e confirmou que a musa tinha mesmo morado ali, logo que veio do Paraná para São Paulo.
Saibam tantos quantos lerem este relato, que do lado de cá do nosso balcão imaginário vive um coração esmagado pelo desencontro com a deusa Sonia Braga. Tanto maior é meu martírio pela sólida certeza de que nunca mais na vida terei outra chance de chegar perto daquele avião...
À direita da foto a casa (fachada verde) onde morou a atriz Sonia Braga, na Av. Vital Brasil, nº. 274.
Foto: Google Street View

2 comentários:

Anônimo disse...

David...penso que vc deve ser amarradão na SONIA BRAGA!

Vc usa a foto dela tb no banheiro? Afff....

Taboão pegando fogo e vc coloca essa matéria. Por que não comenta aparafernalha da vinda de Marta Suplicy - dessa sexóloga - que é DOUTORA em sexo!

Anônimo disse...

David, muito boa sua matéria, eu viajei no tempo, que bom ler um texto tão bom, ando cansado só das desgraças politicas, relembrar toda a sensualidade desse icone é fantastico. Lembro-me que eu nessa epoca estudava em uma escola de informatica na vital brasil!!! lembro-me do dia em que ví um politico de perto, o ex-presidente fiqueiredo. faz tempo.... saudades
parabens