quarta-feira, 11 de abril de 2012

Uma hora o caldo entorna...

Essa ansiedade que você diz,
não é coisa minha, não. É do infeliz
do teu povo. Ele sim que anda aos trancos,
pendurado na quina dos barrancos.
Seu povo que é urgente, força cega,
coração aos pulos, pois carrega
um vulcão amarrado pelo umbigo.
Ele então não tem tempo, nem amigo,
e nem futuro, que uma simples piada
pode dar em risada ou punhalada,
como uma mesma garrafa de cachaça
acaba em carnaval ou em desgraça.
É seu povo que vive de repente,
porque não sabe o que vem pela frente.
Então ele costura fantasia,
sai fazendo fé na loteria,
se apinhando e se esgoelando no estádio.
Bebendo no gargalo, pondo no rádio
sua própria tragédia a todo volume,
morrendo por amor e por ciúme,
matando por um maço de cigarro,
e se atirando debaixo do carro.

O texto acima foi escrito em... 1975!!!
Trecho da peça Gota D’Água, de Chico Buarque e Paulo Pontes

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