domingo, 25 de novembro de 2012

O que a Família Basile tem a ver com o Samba do Arnesto?

Homenagem a Adoniran Barbosa, 
que nos deixou há exatos 30 anos 
– faleceu em 23.nov.1982

Se eu te disser “família Basile”, você nunca vai associar este nome ao samba.
Para a população de Taboão da Serra em geral, sobrenome Basile é sinônimo de latifúndio urbano.
Para os funcionários da Dívida Ativa Municipal, a palavra Basile simboliza calote.
A “nobre” famiglia é dona de vastas áreas espalhadas em vários recantos do município. Gosta de extensões de terras debaixo dos sapatos. Mas odeia pagar tributo pela riqueza que possui.
Certa feita me atrevi a contar quantas cobranças judiciais de IPTU estão em curso contra este clã.
Deu cãibra na calculadora.
Somente na edição de 21.set.2010 do Diário de Justiça, foram publicadas 5.613 execuções fiscais por débito do IPTU contra membros da família Basile.

“O Arnesto nos convidou...”
Mas deixemos a dívida de impostos dos Basile a cargo dos guardiões do cofre público local.
Importante é que um ancestral desta família no Brasil deu emprego a um grande personagem da história da nossa música popular.
A antiga fábrica de ceras Record de Salvadore Basile na 
Vila Mariana, onde o "Arnesto" do samba trabalhou 
Foto: Reprodução
O legendário “Samba do Arnesto”, do compositor Adoniran Barbosa, foi inspirado em Ernesto Paulella, funcionário durante 36 anos de Salvadore Basile, fundador da fábrica de ceras Record.
A cera Record foi campeã de vendas por décadas. Não sei quando o signore Salvadore Basile montou sua empresa. Mas a cera Record já é citada no Diário Oficial da União em 24.jun.1930.
Pesquisa do Ibope realizada em novembro e dezembro de 1942 mostrou que a Record detinha 37% do mercado de ceras para assoalho no país. Mais que o dobro da segunda colocada (cera Parquetina) com 17%.
Antes de migrar para a nossa região em Embu das Artes, a Cera Record funcionou no bairro paulistano Vila Mariana, na Rua Conselheiro Rodrigues Alves, 570. Em 1974 a caldeira da fábrica explodiu e ateou fogo em tudo. A imagem das labaredas ficou gravada no medo dos moradores, que exigiram a mudança da vizinha famosa.
No auge de sua atividade, a cera fabricada pelos Basile tinha um jingle bem popular:
"Vou lhe contar um segredo
Que todos sabem de cor
Dá lustro até num rochedo
A super cera Record"

Viaje agora na história de vida do famoso empregado da família Basile imortalizado no samba injuriado de Adoniran Barbosa.

Olha o Arnesto aí

Por Pedro Nastri
Publicação original do site
(10.nov.2008)
Um dos maiores sucessos de Adoniran Barbosa diz que o Arnesto (acima em foto de Luiza Sigulem) convidou prum samba no Braz, mas quando os amigos chegaram, não havia ninguém...

Mas não é verdade. O Arnesto - na verdade Ernesto Paulella -, hoje com 97 anos, ainda se lembra muito bem dessa história, que ele mesmo vai contar mais adiante.
É verdade que nasceu no Brás, na Rua Flora, onde os pais - imigrantes italianos da região de Nápoles - haviam se instalado desde que desembarcaram no Brasil em 1896. Com seis anos, Ernesto corria as ruas do bairro vendendo chuchu, para ajudar o pai, sapateiro de ofício. Aos onze, arrumou seu primeiro emprego num armazém de secos e molhados na Rua João Antônio de Oliveira, ganhando 14 mil réis por mês.
Esperto, honesto e inteligente, conseguia cativar os patrões, e assim trocou várias vezes de emprego, sempre ganhando um pouco mais. E sempre trabalhando como atendente e balconista. Tinha pouco mais de vinte anos e trabalhava na Casa Planeta, uma loja de miudezas na região do Mercado, quando recebeu um convite para trabalhar na Fábrica de Ceras Record e assistiu a uma das cenas mais insólitas da sua vida: os dois patrões se engalfinhando, na disputa pelo "passe" do empregado. Mais forte, e até porque tinha também um revólver na mão, Salvadore Basile (o dono da fábrica de ceras) acabou levando a melhor. E, mesmo constrangido, Ernesto foi trabalhar com ele, ganhando o dobro do salário e com direito à participação nos lucros. Dali só sairia 36 anos depois, quando já ocupava o cargo de sócio-diretor.
A necessidade de trabalhar não deixou muito tempo para os estudos. Mesmo assim, não deixou de freqüentar as aulas no Colégio Oswaldo Cruz, na Rua da Mooca, e, aos 64 anos, já aposentado, formou-se em Direito. E ainda iria advogar por mais trinta anos.

Como tudo começou

Ernesto tinha dezesseis anos e trabalhava numa papelaria no Brás quando comprou seu primeiro violão (com ele à direita, em foto de Luiza Sigulem), para fazer serenatas com o pai que, além das habilidades no ofício de sapateiro, exibia também qualidades como tenor. Algum tempo depois, juntou-se a alguns colegas de serviço para formar o conjunto "Chorinho da Madrugada". Começaram a tocar no programa de Nhá Zefa, na Rádio Bandeirantes, que tinha seu estúdio na Rua São Bento. Um dia foram dar uma "canja" na Rádio Record, na Rua Conselheiro Crispiniano. E é ali que a história vai começar, pois Adoniran Barbosa estava na porta.

Nhá Zefa fez as apresentações, Adoniran pediu um cartão, olhou e murmurou:
- Ernesto Paulella. Não seria melhor Arnesto?
Ernesto não entendeu. Adoniran emendou:
- É, Arnesto é melhor. Até porque Arnesto dá samba.
Ernesto continuou sem entender. Mas, antes de se despedirem, Adoniran ainda lhe disse:
- Vou fazer um samba com o seu nome, você duvida?

A empatia surgida naquele momento se transformaria em grande amizade, alimentada por longos papos na Leiteria Pereira, na esquina da Rua São Bento com a Praça Patriarca, onde Ernesto tomava água Prata e Adoniran variava entre o conhaque e o Martini. E de onde os dois partiam para tocar nos bancos da Praça da Sé.
Era início dos anos 40 e, a partir daí, os dois tomariam rumos diferentes, para só voltarem a se cruzar mais de quinze anos depois. Ernesto casou-se, em 1941, com Alice, com quem teve seis filhos, um dos quais (uma menina) morreu tragicamente ao escapar das mãos do médico na hora do parto.
Nesse período, depois de passar pela Rua Madre de Deus e pela Rua do Hipódromo e já morando num sobrado da Rua Tagi, próximo da Rua dos Trilhos, viu a Mooca se transformar. A começar pela praça existente ao lado da sua casa (hoje Praça Kennedy), na época, reduto inexpugnável do 5 de outubro, um dos times mais valentes da várzea da Mooca. E também pela própria Rua dos Trilhos, onde existia apenas um córrego e onde, na época de menino, seus colegas costumavam caçar passarinhos. Depois veio a Radial Leste, construída sobre a antiga Rua Conselheiro Justino e que roubou cinco metros do seu quintal. E estava exatamente ali, no quintal, num dia de 1955, quando ouviu pela primeira vez pelo rádio o "Samba do Arnesto", cantado pelos Demônios da Garoa.
Chamou a mulher:
- Alice, essa peteca é minha!
- Que história de peteca é essa, Ernesto?
- É o samba que o Adoniran disse que iria fazer para mim.
Comovidos, os dois se abraçaram. "Não deu para não chorar", lembra ele hoje, novamente com os olhos úmidos.

Mas ainda se passariam dois anos até que Ernesto conseguisse reencontrar o amigo. Convidado para fazer uma apresentação na TV Record, na Avenida Miruna, estava nos corredores da emissora quando apareceu Adoniran Barbosa. Os dois se abraçaram e Adoniran perguntou:
- Arnesto, você gostou do samba que eu fiz pra você?
- Se gostei? Você quase me abriu ao meio de emoção.
- Então, me dá um abraço, que você é meu cumpadre.
Os dois se abraçaram novamente, mas Ernesto não deixou de reclamar:
- Mas você me deixou mal com essa história de dizer que eu dei mancada, que deveria ter deixado um recado na porta. Todo mundo me cobra isso.
Adoniran puxou o amigo pelo braço, deu uma piscada:
- Arnesto, segura essa: se não tinha mancada, não tinha samba.

Adoniran voltaria a emocionar o amigo doze anos depois, no programa Clube dos Artistas, comandado por Ayrton Rodrigues, na TV Tupi, quando lhe entregou autografada a partitura original do "Samba do Arnesto".
O violão espanhol comprado em 1930 na Loja Salmeron, ali ao lado da Praça da Sé, e que deu origem a toda essa história, ainda está guardado - em perfeito estado - num canto da sala. E é a ele que recorre para dedilhar alguma música, quando bate aquela vontade de lembrar um pouquinho do passado.
"Seo" Ernesto guarda com orgulho a primeira partitura de Samba do Arnesto, autografada por Adoniran. Foto: Luiza Sigulem

15 comentários:

Anônimo disse...

Êta DAVID, vc é imbatível!!!!

David da Silva disse...

Pessoa que fez comentário acima é exagerada que só. Ao menos gostaria saber quem é, pra agradecer a consideração.

Anônimo disse...

A pessoa acima representa todos seus leitores e admiradores. Vc é porreta, uai...

Reinaldo disse...

David, gostei muito da matéria; você está de parabéns! Esse, seguramente, é mais "causo" que terei o cuidado de contar aos netos... se os tiver! Abração!

David da Silva disse...

Abração pra vc também, Reinaldo. Obrigado, amigo!

Beline disse...

David, beleza de matéria, muito bom mesmo, abraço.

Pedro Nastri disse...

Olha o David ai gente!!!!!!!!!!

Quando a gente pensa que é bastante forte,que nada consegue nos emocionar o suficiente para nos fazer perder o controle de nossas emoções, surge a inesperada surpresa!
Caminhando pela net, encontrei este site que, para minha surpresa, traz um texto meu.
Infelizmente não teremos mais a companhia terrena do velho Arnesto, pois, no último dia 26/03, aos 99 anos, resolveu se juntar ao amigo Adoniran Barbosa para, lá no paraíso, resolver a questão da tal mancada.
Aliás, quem morreu foi Ernesto Paulelli. O velho "Arnesto" é IMORTAL!
Parafrasendo o grande Adoniran, digo: "Isso não de faz Arnesto, nóis vai ficá com saudade..."
Abraços caríssimo David.

Pedro Nastri

David da Silva disse...

Oi, Pedro Nastri. Muita honra te receber aqui neste nosso blog-boteco. Que bom termos podido render as devidas glórias ao senhor Ernesto em vida. Um abração, e somos todos gratos pelo teu trabalho na preservação da história paulistana. Até breve!

Ana disse...

totalmente desnecessário o comentário da família Basile já que o fico da matéria era outro. Vc deveria rever o modo como escreve e principalmente acusar pessoas. Vc está difamando alguém o que não é nenhum pouco profissional. Sou neta do André Basile que foi dono da Colmeia e que ajudou muito o progresso do Taboao da Serra. Se fomos latifundiários urbanos pode ter certeza que foi as custas de muito suor e muito trabalho. Muito feio o que vc fez e nada legal perante a ex lei de imprensa. Acusar alguém assim é crime sabia? Fica aqui a sugestão para se desculpar desses comentårios desnecessários a minha familia. Aliás, sou jornalista e posso te enviar muitas informações bacanas sobre nós. Ana Paula Basile

Unknown disse...

Parabéns Ana sou muito grado Sr Margarida Basile que infelizmente veio falecer famila muito gentil

Unknown disse...

Familia basile bicho papao tenho orgulho poder ter passado anos lado senhora
Margarida que hoje deus tenha otimo
lugar.

Unknown disse...


clelio luiz de almeida disse...

Todos os sambas escrito por Adoniram,ele, usava a linguagem popular, grande Adoniram, o grande Charutinho das Historias das Malocas, programa que a Record levava ao Ar aos domingos ao meio dia, e que era escrito por Oswaldo mole. Saudades!

Unknown disse...

Sou um membro dos Bailes bisneta de Francesco Maria Basile.gostaris saber fdos membros da irmã de meu avô Antônio Basile pelo pouco que sabemos o nome dela era Maria do Carmo ,para fazermos um documentário sobre os Bailes.mas nós Falta o elo festa tia de meu pai.sei que tem membros no Ipiranga, Jundiaí e por aí vai.de alguém souber peço o favor de nós ajudar neste item obrigada

Anônimo disse...

Nossa, a plutocracia justificando o injustificado...claro que arrogando a si as virtudes do trabalho (alheio). Coisas de Brasil.