terça-feira, 1 de julho de 2008

MANIFESTO DO BOTEQUEIRO

Por José Carlos Asbeg
Quando formos finalmente vencidos pela avassaladora cultura americanalhada, com a cumplicidade dos intelectuais que adoram o povo de longe, na televisão, os botequins serão nosso último reduto, nossa última barricada, nossa definitiva resistência cultural, o que a casbar argelina foi para a vitória sobre os franceses ocupantes.
Lá falaremos botequinês, um dialeto incompreensível para os colonizadores; lá riremos às gargalhadas, algo incompreensível para a racionalidade euro-estadunidense; lá contaremos piadas de nós mesmos e chamaremos udilégui (perna de pau) aquele centroavante que cansa de perder gols na cara do goleiro; lá seremos felizes, sim, felizes, outro algo também incompreensível para os mesmos dominadores.
Os botequins serão a ponta de lança de nossa recuperação nacional. De nossa embriaguez eterna, porque, felizes, avançaremos como um exército brancaleone, fênixes que somos, improvisaremos uma marchinha, reacenderemos as chamas com cevada caseira, esmagaremos com nossa estrondosa felicidade mestiça os usurpadores de nossas cervejas em garrafas e ressurgiremos como o novo paradigma mundial.
Comeremos tremoços, amendoim com casca, sardinha com farinha frita no óleo, moelas com pão esquentado na chapa, lingüiça acebolada com caldinho de feijão coberto de torresmo e cebolinha.

José Carlos Asbeg (na foto imitando o gesto lendário de Bellini) é cineasta, roteirista, produtor e diretor do documentário 1958 – O Ano que o Mundo Descobriu o Brasil.
Veja aqui o site com trailer do filme.

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