Dona da voz brasileira mais elogiada por músicos do mundo inteiro, a cantora-compositora Alaíde Costa aniversaria hoje, e vai comemorar amanhã com show especial no Memorial da América Latina.
Por Aloísio Nogueira Alves
Nestes seus 75 anos bem vividos, Alaíde Costa não pára um minuto. Minto. Ela não pára quieta um segundo sequer. Acabou de gravar um CD em tributo a Johnny Alf, canta hoje à noite no Teatro Castro Alves, o principal de Salvador (Bahia), e amanhã vai soltar a voz no palco do Memorial da América Latina, em São Paulo.
Me lembro da primeira vez que o destino me concedeu a graça de vê-la pessoalmente.
Volto umas horas antes deste encontro inapagável, que é pro coração pegar impulso, entrar no ritmo da grande diva da canção brasileira.
Numa manhã ensolarada de março de 2009, clima propício para um drink matinal, entrei num botequim da praça principal do Jardim Bonfiglioli, zona oeste de São Paulo. Saudei os colegas de biritagem, e me enfurnei num canto lá no fundo do boteco. A mesa coberta por uma toalha bordada com uma paisagem do Rio de Janeiro. Lembrei da viagem que fiz com meu amigo David da Silva para entrevistar o compositor Adelino Moreira no bairro Campo Grande, subúrbio da capital carioca. Aquela foi a última empreitada cultural que fiz com David (antes tínhamos entrevistado Belchior e o imortal Paulo Vanzolini). Desde então, ponderamos vários nomes para novas reportagens, mas tudo ficou empacado no plano das idéias.
Pelos meus anos de copo e de cruz senti que as lembranças davam um grau a mais no álcool. Melhor sair na caminhada. E fui. Na altura do número 400 da Avenida Heitor Antonio Eiras Garcia, aquela muvuca de gente na porta do banco. Minha atenção redobrada por causa da calçada esburacada e da visão turva pelo que havia bebido. Cabisbaixo pela tristeza que me deu a saudade do grande Adelino Moreira. Desenxabido porque não me surgia uma luz para nova e brilhante entrevista.
Levanto a cabeça. Quem é aquela senhora ali, com ar de rainha afro-brasileira, poucos metros à minha frente? Estou sonhando? Tô não! Criei coragem, abri os braços e soltei a saudação: “Dona Carmem Costa! Que prazer! Não acredito no que está acontecendo!!! Quanta honra Dona Carmem Costa!”.
O sorriso aberto naquele rosto negro lindo me encheu de satisfação, alegria transbordando pelos poros junto com o conhaque. A voz meiga, suave, pausada, flutuando no ar como se estivesse cantando, me penetrou como se fosse uma lâmina. “A Carmem é muito minha amiga, gosto muito dela! O senhor está me confundindo. Eu sou a Alaíde Costa.”
Maldita bebida! Todo o meu sonho e do David se evaporou na brisa refrescante que acariciava as folhas da paineira junto à antiga Faculdade Butantã. Eu desperdiçava ali, entre os buracos do calçamento, uma grande oportunidade de marcar entrevista com uma das maiores cantoras do Brasil e do mundo em todos os tempos. Me desculpei, me afastei, estraçalhado, afogado na vergonha.
Conduzindo miss Alaíde
Conduzindo miss Alaíde
Meu único consolo era tê-la ouvido dizer que morava ali mesmo no Jardim Bonfiglioli. Quem sabe num próximo encontro eu não dê tamanha mancada. E me encabulava o fato de eu também morar há anos naquele bairro, e nunca ter tido a sorte de me deparar com tão histórica figura da cultura nacional...
Semanas depois, perambulando pela mesma avenida, de longe a avistei. Engatei o elogio: “O povo brasileiro não reconhece seus valores. Ao invés desta calçada esburacada, aqui devia ter um tapete vermelho para a senhora passar”. Ela me olha surpresa, o mesmo sorriso pleno de doçura, com uma pontinha de malícia no canto da boca pelo tropeço que a memória me deu na vez anterior. Batemos um papinho rápido, maneiro, coisa de fã com a estrela da arte.
Num certo domingo, eu de novo zanzando pelo bairro, lá vem Alaíde Costa de novo. Já somos amigos!, regozijei. A famosíssima Alaíde Costa me chama pelo nome!!! “’Seo’ Aloísio, o senhor não quer me dar uma carona até a feira do Jardim São Domingos?” Você já viu súdito negar para uma rainha? Meu humilde Golzinho converteu-se numa carruagem, e lá fui eu conduzindo Miss Alaíde, junto com uma mocinha que a acompanhava. “Não precisa me esperar. O que o senhor fez já está bom demais”, despachou-me ela com a voz por onde escoa leite e mel. Fiquei olhando-a misturar-se à multidão, sacola na mão, como se fosse um ser humano como outro qualquer. E não é – eu atesto!
Agora já tenho a liberdade de telefonar para Alaíde Costa vez ou outra. Ela garantiu a mim e ao David que vai-nos conceder a entrevista. É aguardar a hora propícia.
E nos convidou a assistir o show de aniversário dela amanhã, no Memorial. Estaremos lá, nós e uma legião de adoradores.
Com Alaíde Costa (voz), Giba Estebez (piano) e Vitor Alcântara (flauta).
Dia 9 de dezembro – quinta-feira – 21 horas
Ingressos: Grátis (não haverá distribuição antecipada; a porta será aberta às 20h)
Memorial da América Latina – Av. Auro Soares de Moura Andrade, 664 – Barra Funda/SP - Tel: (11) 3823-4600
Duração: 1h15 - Censura: Livre - Capacidade: 800 lugares
Acesso universal. Ar condicionado. Estacionamento (Portão 15) s/ manobrista: R$ 10,00. Entrada pedestres: Portão 13
Ouça Alaíde Costa em:
Valha-me, Deus! (Hermínio Bello de Carvalho – Baden Powell)
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