Estação
Retiro do metrô de Buenos Aires foi inaugurada em 1936.
Foto:
David da Silva – 05.maio.2014
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O metrô
que me levou até a estação Retiro, na zona leste de Buenos Aires, estava todo
grafitado.
Até
setembro do ano passado, dos 567 vagões do metrô da capital argentina, 399
deles estavam cobertos por pinturas graffiti.
Antes
que você (que adora graffiti, eu sei) ache isto bonitinho, aviso logo. Não é
uma integração da Metrovias com a cultura de rua. É o rastro colorido da
rebeldia nas entranhas da metrópole portenha.
Os
próprios grafiteiros com quem conversei no bairro Palermo, zona norte da
cidade, dão a letra: “No dia que autorizarem a grafitagem dos trens, a gente
pára. Gostamos de ser ilegais”.
Devido à
crise econômica do país, a Companhia do Metrô havia parado de remover os
graffitis. Cada limpeza de vagão custa em torno de $ 35 mil a $40 mil pesos
argentinos. Por questão de economia, limpavam apenas as janelas. E reduziram os
gastos com o pessoal da segurança.
Trem grafitado antes de começar a funcionar |
Agora o
caldo entornou. Antes de ontem, terça-feira, dia 27 de maio, a própria
presidente Cristina Kirchner soltou os cachorros pra cima da galera grafiteira.
“Não se trata de denunciar. É defender. Não é justo que se queime o estofamento
dos bancos do metrô com bitucas de cigarros, que rabisquem ou escrevam [nos
vagões]”.
Dona
Cristina ficou puta porque os trens novos da linha Sarmiento, entregues na
sexta-feira passada, ainda nem entraram em operação, e já amanheceram
grafitados no domingo.
O
sistema subterrâneo de trens em Buenos Aires foi inaugurado em 1913. Mas 27
anos antes, desde 1886, já havia planos para transportar a população bonaerense
por debaixo do chão.
Mendigo na estação Retiro, zona leste da capital argentina.
Foto:
David da Silva – 05.maio.2014
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Os
argentinos chamam o seu metrô de SubTe.
Deixar
sua marca com traços e cores no metrô é a grande adrenalina dos manos (e
algumas minas) do lugar.
A tinta
spray mais utilizada pelos artistas clandestinos é a Kwait, de fabricação
argentina. Custa em torno de $ 25 pesos. Os mais afortunados preferem a marca
Montana, importada da Espanha - $ 45 pesos a lata.
Para as
invasões noturnas das oficinas onde os vagões dormem, os grafiteiros costumam
dar maços de cigarros para os cartoneros
(catadores de papel) que dormem nas ruas em torno dos pátios de manobras e
manutenção do trem metropolitano. Mas esses cartoneros
também costumam caguetar os grafiteiros para a polícia. Afinal os guardas os
deixam dormir naqueles locais para ajudarem na vigilância informal. E os
mendigos atuam assim, no jogo duplo, conforme suas conveniências.
Mano grafiteiro parte para mais uma missão |
A moral
de um grafiteiro é medida pela sua ousadia. Uma bomba (marca pessoal simples) em um vagão pode ser coberta por um cromo que leva preenchimento prateado.
Um cromo pode ser coberto por uma pieza, que é um graffiti mais elaborado.
Já uma pieza pode ser coberta por um end to end, graffiti que vai de ponta a
ponta do vagão. Um end to end pode
ser coberto com um whole car – vagão inteiro.
O whole car pode ser coberto pelo triple whole. A glória das glórias é o whole train – grafitar o trem inteiro.
A
Subterráneos de Buenos Aires Sociedad Del Estado contratou em 2013 uma firma
especializada em remoções de tintas. A empresa desenvolveu um produto que
retira o grafitti sem prejudicar a pintura original dos vagões. Depois de meia
hora aplicada sobre o desenho, a substância faz a tintura artística secar e
pode ser removida como fosse uma pele ressecada. Depois disto é aplicada sobre
o trem uma solução química anti-graffiti. Caso ocorra um novo “ataque”, é só
limpar com um trapo embebido em álcool.
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