domingo, 13 de janeiro de 2008

Perto do coração do Vale do Ribeira

Expedición Donde Miras chega a Miracatu, a 140 km da Capital

A Caminha Cultural pela América Latina, organizada pelo Sarau do Binho, emitiu neste domingo, 13 de janeiro, mais um relatório de viagem. A Expedición Donde Miras começou no último dia 5 de janeiro com intervenções artísticas nas cidades de Taboão da Serra, Embu das Artes, Itapecerica da Serra, e Juquitiba. Nesta primeira etapa, os expedicionários culturais vão caminhar até Curitiba/PR. A caravana vai percorrer ainda Paraguai, Uruguai e Chile.
Atualmente os artistas-expedicionários caminham em direção ao município de Miracatu, que na língua tupi significa “terra de gente boa”. A localidade tem 24.906 habitantes, e fica a 137 km da Capital de São Paulo.
Crônica de viagem da expedicionária Diane Padial*:
“Saímos de Juquitiba pela manhã, por volta das 09:00 hs. Decidimos que iríamos por trecho alternativo; a quilometragem variava segundo alguns informantes. Teríamos 20 km, e fomos, estradinha de terra, sombra e muitas águas de formas variadas, lagos, riachos cachoeiras...
Depois de uns três quilômetros, o café da manhã foi sobre a ponte do Rio Juquiá, em meio à mata. Paisagem de deixar qualquer um estarrecido ao vislumbrar aquela natureza toda para nosso desfrute. A toalha foi estendida no beiral lateral da ponte. Mas, antes, enquanto o carro de apoio não chegava, grande parte do grupo começou a desbravar aquele paraíso - alguns caminhavam, outros mergulhavam, alguns tomavam sol para um bronze, sobre as pedras da cachoeira.
Experiências inesquecíveis e inéditas, momentos de romper barreiras interiores, medos. E daí alguém ousa a praticar tirolesa e lá vai um, dois, e aí a farra: “Chibummmm!”. A aquela água presenteada por todos os deuses, merecida para refrescar os corpos cansados e suados da caminhada. A beleza do rio, desfrute único.
Pela frente ainda o dia todo com mais 12 km a caminhar sob um sol escaldante, que no asfalto que nos esperava representaria 40 graus. Conversas, fotos. Todos alimentados, seguimos para Santa Rita depois da Serra.
No percurso recebemos a ligação de que conseguimos um local para ficar em Santa Rita.
Este dia foi uma exceção. No trajeto, teríamos que atravessar a serra de carro, por uma medida de segurança. Havia muitos trechos sem acostamento, comprometendo a caminhada, e assim foi feito. Os dois carros de apoio desceram até Santa Rita, transportando as pessoas. Enquanto uma turma era conduzida, a outra aguardava num posto de gasolina o retorno. Foi um percurso demorado – 64 km de ida e volta. Quem foi a frente iniciou a limpeza do alojamento e a preparação do almoço.
Neste lugar não havia nada programado. Rapidamente abrimos contato com um mercadinho, e ai fizemos um belo churrasco na quadra de esportes do vilarejo. A chegada de todos nós causou muita curiosidade nos moradores daquela comunidade.
Passamos a pesquisar o lugar, conhecer seus moradores e pontos de atração. As crianças foram os primeiros a aparecer no alojamento. Uma em especial nos adotou, o Enio. Ele passou a nos dar toda as informações da localidade, e nos levou para conhecer o Rio, ali pertinho no final da rua. Fomos seguindo uma trilha, e lá estava uma beleza que traz à tona uma compreensão mínima do que é viver naquele vilarejo ao lado do rio. O desprendimento dos meninos caindo na água, a tirolesa novamente presente, aquele barro, beleza...
A equipe do cinema prepara a apresentação de filme na parede do alojamento. As poucas pessoas vão passando e ficando. Estamos na rua mais movimentada dentre as pouco mais de três existentes. Pessoas sentam-se na calçada e assistem de lá mesmo. As crianças são o maior público. Vários jovens, sentados em suas bicicletas, assistem da rua a sessão de curtas metragens. Alguns do nosso grupo dirigem-se aos espectadores conversando sobre os propósitos da expedição.
Surge a pessoa que articulou a nossa estadia no vilarejo de Santa Rita, ao pé da serra, o Vereador Bicoito. Então vamos conversando com esta pessoa simples demais, frentista de um posto de gasolina. Ele vai nos relatando muitas histórias sobre aquele lugar, seus modos e costumes, aquela gente ali do Vale. Regados a cerveja do barzinho do pai do menino Ênio, a conversa vai fluindo, e o cansaço vai afastando os caminhantes para o descanso.
No dia seguinte partiríamos para Miracatu, com 28 km a nossa frente para ser vencidos. Novo lugar, novas pessoas, novas histórias. A natureza entrando gente a dentro, purificando nossas almas, valores e construção interior. Conhecimento se emaranhando às nossa indagações, e assim seguimos cansados, mas com um ânimo absoluto diante de nossas buscas.
E segue a Expedición Donde Miras.
Salve!!!”
* Diane Padial é irmã de Robinson Padial, o Binho, idealizador do projeto, e esposa de Serginho Poeta, parceiro do cunhado no livro Donde Miras que inspirou e deu o nome à expedição.

Crônica da poetisa Tula Pilar:
"Nossa primeira parada depois de Juquitiba e após 14 km de caminhada, foi no posto de gasolina onde o Vereador Biscoito trabalha. Após tomarmos água, fomos visitar uma reserva indígena Tupi Guarani. Fomos recebidos pela Sara (nome em português), que é professora da aldeia. Para a nossa decepção, os habitantes estavam trabalhando fora vendendo artesanato - inclusive a cacique.
Conversamos um pouco enquanto alguns compravam artesanatos, arcos e flechas, zarabatanas e faixas para o cabelo. Em seguida fizemos uma roda para dançar, enquanto a Sara cantava.
Fomos embora emocionados ao som do canto suave e maravilhoso daquela moça.
Aueté, Sara!!!”

Foto: Ailton Luiz Gouveia

A estação ferroviária de Miracatu foi construída pelos ingleses em 1914. Ligava Santos-Juquiá. Em 1997 o transporte de passageiros foi suspenso, depois de 84 anos. A linha serviu aos trens de carga até o início de 2003, quando a queda de barreiras interditou a linha, coberta rapidamente pelo mato.

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