Noel Rosa parecia ter sido picado pela mosca tsé-tsé . Ele era consciente disto. Quando tinha algum compromisso importante pela manhã, espalhava pela casa inteira avisos enormes, alertando a família contra suas invencionices para não deixar a cama:
“NÃO SE ESQUEÇAM! PRECISO ACORDAR CEDO!"
"GRAVAÇÃO ÀS 10 HORAS DA MANHÃ! IMPORTANTÍSSIMO!"
"NÃO ACREDITEM EM MINHAS DESCULPAS!!!”
Quando o sono de Noel se mostrava ainda mais difícil para arrancá-lo dos lençóis, dona Marta, sua mãe, recorria a um mulato gordinho, muito solítico, apelidado de Calulá, entregador de roupas de uma tinturaria próxima da casa do sambista. Calulá sentava pachorrentamente na beira da cama, levantava uma ponta da coberta, e com sua voz fanhosa:
- Noeel... Noeel... Noeel...
O compositor puxava a coberta pra cima da cabeça. Calulá retomava a cantilena. Noel escondia a cabeça debaixo do travesseiro.
- Noeeeel... Noeeeel... Noeeeel...
O Poeta da Vila sentava-se estremunhado:
- Já sei, Calulá. Já vou levantar. Pode ir.
- Noeeeeeeeel... Noeeeeeeeel... – Calulá estava escolado; várias outras vezes Noel o havia dispensado, para a seguir ferrar novamente no sono.
- Noeeeeeel...
- CHEGA!!! – e Noel saltava do colchão. Somente aí o mulato ia embora com um risinho vitorioso nos lábios.
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