terça-feira, 28 de dezembro de 2010

A fruta nossa de cada noite

Kaká, o vendedor de frutas - Foto: David da Silva - 27.dez.2010
Geralmente vejo Kaká nas noites altas do boteco Fecha-Nunca no Largo do Campo Limpo. Engraçado é que Kaká nunca “está”. Explico: ele está sempre indo ou voltando:
“Fui vender lá no Rio Pequeno”, se a passada pelo bar é à boca da noite.
Se a madrugada avança:
“Tô indo agora vender lá na Vila Madalena”.
Se não vai (ou não foi) vender, a parada no boteco também é ligeira:
“Tô indo lá ver minha filha na casa da mãe dela”.
Cada frase arrematada com o bordão:
“Comigo é pau-no-gato!”.

Na carroceria da camionete azul a paisagem lembra Clarice Lispector: “maçãs vermelhas, abacaxis malignos na sua selvageria, laranjas alaranjadas e calmas, uvas pretas que mal podem esperar pelo instante de serem esmagadas, uma talhada vermelha de melancia com seus alegres caroços. Tudo cortado pela acidez espanhola que se adivinha nos limões”.
E pau-no-gato!

Na carteira de identidade Kaká é José Ricardo Rodrigues de Farias. Nascido no distrito Venda Nova, Belo Horizonte, em 29 de abril de 1969. Signo de touro – forte, batalhador, pé no chão. Dona Maria José Gomes se mandou pra São Paulo com Kaká, então com sete anos, e mais quatro filhos. Fincaram residência no Jardim Olinda, região do Campo Limpo, zona sul de Sampa. Do pai Luciano Rodrigues de Farias, Kaká não tem notícias: “Não conheci meu pai. Eu tinha vontade de conhecer ele”, diz com uma ponta de tristeza na voz.

A entrada de Kaká no ramo de frutas não foi como vendedor. Muito menos como comprador. “Eu catava restos das frutas com meus irmãos debaixo das bancas da feira do Parque Ypê. A gente não tinha o que comer em casa”, conta.
Mais grandinho, Kaká se virou vendendo limão. “Vendia limão na mão. Não tinha caixote pra pôr em cima. E pau-no-gato! Eu vendia assim, ó”, e empalma na mão o monte imaginário de limões.
Ao ver o esforço do moleque, o feirante japonês Luiz ofereceu emprego. “Eu vendia limão, mas tinha de continuar pedindo esmola, porque vendia muito pouquinho. Aí o japonês ficou com dó de mim”, lembra Kaká.
Depois de anos como empregado, foi vender por conta própria. Quase quebrou. Chegou a passar no exigente teste de um grande hipermercado.  Ia ser chefe do setor de horti-fruti... Mas prefere a vida solta das ruas.
Para as donas de casa, a venda diurna de porta em porta. Para os boêmios, a refrescância das frutas anti-ressaca vendidas nas madrugadas de boteco em boteco.
E pau-no-gato!~

Kaká Frutas Selecionadas
Fones: 9369-0492 e 8534-5499

2 comentários:

Matheus Trunk disse...

Meu caro amigo David: um feliz Ano Novo pra você e toda sua família. Por favor, no próximo ano continue perfilando essas figuras que só você acha. Esse Kaká é figuraça pelo jeito.

Matheus Trunk
www.violaosardinhaepao.blogspot.com

David da Silva disse...

Ô, Matheus!
Também te desejo um 2011 com muita saúde, e muitas pautas boas pela frente.
Parabéns pelo prêmio que vc recebeu pelo trabalho na Zigu.
Você é o perfeito "amigo leal" que o Adelino e o Nelsão cantaram.