Pezão, Sérgio Vaz e Marcelino Freire no Ciclo de Encontros Literários - Foto: David da Silva |
Para deixar devidamente
esclarecido quem são os dois maiores "culpados" por haver tantos e
tão bons saraus de poesia espalhados hoje pela Grande São Paulo, o escritor
Marcelino Freire organizou, no anoitecer do último sábado, 8 de maio, um
bate-papo com os poetas Sérgio Vaz e Marco Pezão, criadores do Sarau da
Cooperifa.
"Há um tempão que eu
queria recebê-los para uma conversa. Já fiz vários eventos com Sérgio. Vários
com Pezão. Mas nunca assim, com os dois juntos", disse Freire ao abrir o
evento que integra o Ciclo de Encontros Literários no Centro Cultural b_arco,
em Pinheiros.
Poetas explicam seus processos de criação - Foto: David da Silva |
"Quem me apresentou
ao Sérgio Vaz foi o jornalista David da Silva", respondeu Marco Pezão à
pergunta de Marcelino Freire sobre como tudo começou.
Em 1999 eu ancorava um
programa de notícias numa rádio-pirata aqui em Taboão da Serra. O Pezão fazia a
crônica esportiva. Cada edição era encerrada com homenagem a um poeta. Naquele
ano Sérgio Vaz lançava Pensamentos Vadios, seu terceiro livro. Cada um já conhecia
o trabalho do outro. Sérgio já havia inclusive votado num poema do Marco Pezão
num concurso literário. Mas foi naquele estúdio de emissora clandestina que se
deu o primeiro aperto de mãos.
Para Marcelino Freire,
"daqui a um tempo, quem for estudar a literatura brasileira terá de se
debruçar sobre a trajetória destes dois, que criaram um movimento vigoroso de
prática e difusão da poesia".
De onde vem o poema
Os dois convidados de
Marcelino Freire revelaram para a plateia os seus processos de criação.
Para Marco Pezão, o
primeiro impulso para escrever veio do tempo em que fazia teatro. Daí que sua
poesia é altissonante, feita na medida para ser recitada em público.
Sua grande influência veio do poeta Solano Trindade.
Sua grande influência veio do poeta Solano Trindade.
Pra completar, a certidão
de nascimento de Pezão traz a grife Iadoccico, vinda lá da Itália famosa pelo
seu povo falante e expansivo. Não à toa chama-se A Plenos Pulmões o sarau que
ele realiza na Casa das Rosas.
Como também é repórter,
boa parte da produção literária de Pezão vem dos noticiários. Seja um corpo
estendido no chão defronte à sua casa, ou o assassinato do terrorista Bin Laden
(com cujo nome brinca devido à aproximação com a expressão popular
"bimbinha", relativa a pênis).
No conjunto de sua obra ainda não publicada em livro, Marco Pezão é famoso no circuito da literatura marginal com sua premiada poesia Mina da Periferia. É dele também o poema que se tornou um hino para a cultura da periferia: "Nóis é ponte e atravessa qualquer rio".
No conjunto de sua obra ainda não publicada em livro, Marco Pezão é famoso no circuito da literatura marginal com sua premiada poesia Mina da Periferia. É dele também o poema que se tornou um hino para a cultura da periferia: "Nóis é ponte e atravessa qualquer rio".
Sérgio Vaz situa na
infância rodeada por livros o seu apêgo às letras. Desfeitos seus sonhos de ser
jogador de futebol e tempos depois letrista de canções, encontrou seu próprio
caminho rascunhando poemas nos papéis de pão sobre o balcão do bar e mercearia
de seu pai.
Marcelino Freire detectou
um viéz trágico em duas das poesias lidas por Vaz no encontro.
Creio que isto venha do
seu DNA das Minas Gerais, famosa por exportar "minérios e mineiros" e
exalar sua melancolia entre as montanhas. Mas quem conhece o poeta Sérgio em
carne e osso sabe que ele á mais sorrisos do que introspecção. Frasista
incurável, e sarrista de temida pontaria.
Outra característica
marcante na vida e obra de Sérgio Vaz é sua já famosa dificuldade de dormir. O
cara é tão poeta que tem rima até na sua falta de sono. O homem da insônia é
casado com a Sônia.
Antes de encarar o
computador noturno, ele prepara seu café. Enquanto a água esquenta, sua cabeça
fervilha. Foi destas vigílias que nasceram atividades feito o Ajoelhaço, a
Chuva de Livros, a Poesia no Ar, o Cinema na Lage...
Foto: David da Silva |
Uma saraivada de saraus
No ano 2000, poetas e
outras pessoas amantes da poesia em Taboão da Serra se encontravam de forma
fortuita no Bar do Portuga. Era a Quinta Maldita, onde Sérgio Vaz estreitou
laços amistosos e etílicos com o seu então novo colega Marco Pezão. Por
estranha ironia, bem em frente ao boteco, no outro lado da rua, fica o enorme
salão do centro municipal de recreação e cultura. Mas a própria sigla do lugar
(Cemur) já sinaliza que sua maior destinação é a outros fins que não a Arte. Se
fosse "Cemuc" a gente tinha mais chances, nénão?
Passado um tempo os poetas
se tocaram que o tal "portuga" já não lhes sorria por trás do balcão.
"Tá na hora de a gente achar um canto só pra nós", decretaram-se
mutuamente Vaz e Pezão.
No ano e meio seguinte os
poetas erguerram sua barricada literária no Bar Garajão, ainda em Taboão da
Serra. O botequim fechou sem prévio aviso. Lá se foi a poesia procurar abrigo
nas quebradas da zona sul da vizinha capital São Paulo.
A Cooperifa estava longe
de sua terra natal. Mas Sérgio Vaz estava de volta ao bairro Piraporinha onde
cresceu e amou suas primeira letras e leituras. Tudo em casa.
No ano 2004 os
cooperifados adentraram no mundo editorial, com a antologia poética de 43
artistas anônimos da periferia. O nome do livro - O Rastilho da Pólvora - foi
profético.
Em 2012 uma ong cultural
elaborou o Mapa dos Saraus, contabilizando 60 pontos poéticos na região
metropolitana, no interior e litoral paulista. Tem mais. Pode contar de novo
que tem gente semeando versos por muito mais lugares.
E em cada um destes
espaços de celebração da poesia estão as digitais dos pais da Cooperifa. Que já
foi muito mais longe do que seus criadores possam imaginar.
O rastilho poético já
cruzou divisas estaduais e fronteiras nacionais. Em Hamburgo, na Alemanha, duas
semanas atrás, Sérgio vaz foi cumprimentado por um estudante alemão que já
havia estado no Sarau da Cooperifa.
E nem no longínquo sertão
pernambucano a Cooperifa dá sossego. "Estive em Ouricuri, a mais de
4 comentários:
Grande David da Silva. Abraço.
Três que merecem salva de palmas permanentemente: Pezão, Sérgio Vaz e David Silva!
Três que merecem salva de palmas permanentemente: Pezão, Sérgio Vaz e David Silva.
Dois grandes poetas que com certeza já fazem parte da nossa literatura e muito contribuem para a divulgação da nossa literatura "marginal". Foi lendo Sérgio e ouvindo Pezão que retomei os meus escritos que guardava nas gavetas.
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