terça-feira, 16 de setembro de 2014

Cinquentão, Jardim Iolanda “dá à luz” 650 novas árvores

Foto: Nilton Esteves - 23.ago.2014
Na porta de entrada da casa do Nilton, no canto esquerdo externo tem um termômetro, um barômetro e outro ômetro do qual só lembro o sobrenome. Do teto da varanda despencam mini flores sapatinho-de-judia. Em cachos encachoeirados. Moldura perfeita pra deixar beija-flor endoidecido e fotografar rostos queridos.
Antes da reportagem, o almoço. Uma bacalhoada magnífica brota das mãos mágicas de dona Magnólia, que reina no fogão da família Esteves há 13 anos. Reflito: “o Nilton é tão apaixonado pela Natureza, que o destino lhe providenciou uma cozinheira com nome de planta”.
Nilton Benedito Esteves é há 12 anos síndico do Condomínio Rural Jardim Iolanda, em Taboão da Serra. O conjunto habitacional completou 50 anos de fundação no último 20 de agosto. É um remanescente da Mata Atlântica no município. E razão de viver do síndico.
Carolina Ramos e jornalista Sandra Pereira
“Como nosso síndico, o Nilton é um fator de garantia de que minha casa não vai se desvalorizar”, diz a psicanalista Carolina dos Ramos, moradora fixa do lugar desde julho de 1989 – a família, no entanto, é proprietária no condomínio desde a década de 1960, quando o lugar era usado por alguns apenas para lazer. Hoje todos os 120 imóveis do condomínio são habitados.
Prova da abnegação do síndico pela preservação da cobertura vegetal do condomínio, foi o plantio de 400 mudas de árvores pelo DEAEE (Departamento Estadual de Águas e Energia Elétrica) em substituição às 10 espécies nativas arrancadas para abrir caminho à canalização do córrego que corta o Jardim Iolanda.
Mudas em crescimento - Foto: Nilton Esteves
O condomínio replantou por conta própria mais 250 mudas no trecho canalizado. Todos os dias, antes de iniciar sua rotina de trabalho, o síndico Nilton dedica longos minutos a contemplar o crescimento das 650 mudas de ipês-amarelos, paus-ferro, patas-de-vaca e sibipirunas.
O resultado desta dedicação é convertido em números nas eleições do condomínio. Em outubro de 2013 Nilton Esteves foi reeleito com 53 votos dentre as 65 pessoas que compareceram ao pleito – o condomínio tem 120 eleitores, e o voto é aberto, declarado em viva voz.

Rígido no desempenho da função de protetor de uma área de quase 500 mil metros quadrados - pra ser exato: 477.965,00 m² -, e lutador encarniçado pela construção dos viadutos para retornos na BR-116 na altura do Km 276 e no Shopping Taboão, o síndico, todavia, é gentil no trato com as pessoas. E apaixonado por sua câmera fotográfica. Gasta horas a fio clicando o nascer e o pôr do Sol. E emenda noite adentro retratando a Lua. Fixa seu foco na exuberância da mata que reveste o condomínio e seus animaizinhos silvestres. Capaz de se emocionar diante de uma amoreira se abrindo em frutos. “Hoje voltei aos meus 8 anos de idade, quando apanhava a fruta no pé, e saboreava amoras, carambolas, jabuticabas, mangas, pitangas, nêsperas, etc... Tudo tem sabor de infância”, me escreveu ele no Facebook no entardecer sentimental do último dia 5 de setembro.
O desvelo pelo seu passado é marca registrada do síndico Nilton. Sempre saudoso dos tempos de moleque em que assistia Tarzan, Homem de Virgínia, Dólar Furado, Perdido nas Estrelas, Zorro, Túnel do Tempo, e outros seriados que marcaram a adolescência da televisão brasileira.
Nilton Esteves
Com a infância vivida no Sítio Tanquinho, em Dois Córregos, interior de São Paulo, o síndico Nilton conserva a hospitalidade típica das pessoas ligadas à terra.  Que gosta de receber gente em casa. E de brindá-las com comidas especiais. Chegou até a inventar a Salada Tropical Nilton. Cada visita vira um retrato na parede apinhada de fotos das pessoas que lhe falam ao coração. Órfão quando sua mãe estava com 44 anos, Nilton estampa no fundo da parede da sala de estar um pôster dela. Linda feito uma Rita Hayworth.

Para manter o Jardim Iolanda na forma com que foi planejado pela sua fundadora, Nilton Esteves comanda um pequeno exército de seis porteiros, quatro jardineiros, um encarregado, uma faxineira e patrulhas de seguranças armados.

A devoção do síndico pela fundadora do condomínio é quase diariamente revivida em sua página no Facebook. Emoldurados na parede da sala de visitas do Nilton, vários cartazes de espetáculos que Iolanda Catani lhe trazia de presente nas suas viagens à Europa. Outra demonstração de afeto do síndico por dona Iolanda é o vídeo que ele gravou num crepúsculo solar há 30 anos – e que compartilha com amigos numa deferência quase religiosa. Na gravação, Iolanda Catani, que era cantora lírica, entoa a Ave Maria de Gounod e Johann Sebastian Bach (assista aqui)

Cláudio Catani e eu - Foto: Nilton Esteves
Escoltado gentilmente por Nilton Esteves fui conhecer a casa onde viveu dona Iolanda. O local é identificado por uma placa onde se lê Olimpo. Todas as ruas do condomínio têm nomes de musas da mitologia grega.
Somos recebidos pelo engenheiro-agrônomo Cláudio Catani Beretta, filho de Iolanda. O sobrenome Catani da mãe é originário de Florença, e o Beretta do pai, vem de Milão.
Cláudio Catani Beretta se formou engenheiro-agrônomo no mesmo ano em que seus pais fundaram o condomínio. Ele me mostra na biblioteca dos seus genitores uma raridade. O Dizionario Storico Mitologico em vários volumes que sua mãe sempre consultava, e de onde saíram os nomes das ruas para o Jardim Iolanda. A obra foi publicada em 1828.
Toda a sala de visita dos pioneiros é decorada por obras de arte de Gino Catani, avô de Cláudio, e outros quadros de seu bisavô, do qual infelizmente não conseguimos descobrir o nome.
Gino Catani - Foto: Nilton Esteves
Gino Catani nasceu no ano 1879 em Florença, Itália. Veio para o Brasil com apenas 14 anos. Em 1908 voltou à Itália para se especializar em pinturas decorativas. Quando retornou ao Brasil em 1909, trabalhou na decoração da Igreja de Santa Cecília juntamente com Benedito Calixto. É também de Gino Catani a decoração da Igreja Santa Ifigênia pela mesma época, ambas na cidade de São Paulo. Em 1913 Gino decorou a capela da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Também executou pinturas e murais em residências particulares, e desenvolveu intensa produção artística em desenhos e telas. Gino Catani faleceu em 1944, 20 anos antes de sua filha fundar o Condomínio Rural em Taboão da Serra.
Vejo na estante de dona Iolanda Catani três artesanatos de corujas. Esta ave é símbolo deste blog bar & lanches taboão. Fiquei feliz de encontrar nossa mascote na prateleira da casa da pioneira.

Formado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, em Araraquara, Cláudio exerceu por 35 anos a profissão. Manteve várias parcerias com seu pai em fazendas pelo interior do estado de São Paulo.
Fiel ao seu ofício, Cláudio critica a forma como as autoridades ambientais tratam hoje a compensação na derrubada de árvores. “Se uma pessoa desmata aqui no Condomínio Iolanda, o replantio de árvores deve ser feito exclusivamente aqui dentro. E não como fazem hoje, em que o desmatador pode fazer a compensação vegetal em outro local”, adverte.

De sua mãe Cláudio guarda uma lembrança bem humorada. “Certa vez ela foi cantar uma peça lírica, e a personagem que ela fazia morria no final. Mas eu reparei que minha mãe se levantou antes de baixar a cortina no final do espetáculo. Fui fazer uma espécie de crítica a ela, e recebi de resposta: ‘Se eu não tivesse pulado antes de descer a cortina você seria um menino órfão, agora. Aquele cortinado estava caindo com todo o peso em cima de mim’ “.

3 comentários:

bjnho disse...

uma bela materia um lugar tao bonito e bem cuidado parabens Nilton





Ariel Souza disse...

Sr.Benedito,se não fosse pelo sr.o condomínio poderia descaracterizar-se em sua originalidade e as consequências viriam também sobre quem mora no entorno do condomínio. Infelizmente a maioria das pessoas desconhecem que as arvores são os humidificadores do ar que respiramos, sem citar o oceano. Se Taboão da Serra fosse arborizada como antes fora, teríamos temperaturas mais agradáveis e menos pessoas com problemas respiratórios.
Infelizmente há uma cultura de derrubar árvores e cimentar tudo que é possível, aumentando a temperatura do ambiente e impermeabilizando o solo e nessa época de seca sentimos o efeito disso.
Albert Einstein dizia:
“Tudo aquilo que o homem ignora, não existe para ele. Por isso o universo de cada um, se resume no tamanho de seu saber.”
Entristece-me ao passar por Embu das Artes e ver as ocupações irregulares recentes; sem planejamento algum e em áreas aonde havia nascentes de água, sabemos que isso ocorre em troca de votos e grilagem; um pedaço da Mata Atlântica que se vai. Ao menos se houvesse planejamento o impacto seria bem menor inclusive visualmente.
Mas fica registrado meu respeito a cidadania que o sr. Exerce.

Unknown disse...
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