Naloana Lima e Martinha Soares - Foto: Wilson Cortez |
Para mim
foi emblemático o Grupo Clariô de Teatro estrear em outubro a peça Severina - da Morte à Vida. Num dia 5
deste mês, em 1897 o governo carnicento do Brasil trucidava os defensores de
Canudos, no sertão do Estado da Bahia. Canudos não se entregou. Lutou até o
último homem. Nada melhor que este mês briguento para o Clariô abrir nova
temporada, marcando seu 10º ano de vida e de teimosia.
Severina - da Morte à Vida estreou na 5ª-feira, dia 8, e fica
em cartaz até 8 de novembro, com apresentações de 5ª-feira a domingo, sempre às
20h30, com entrada franca.
Naruna Costa - Foto: W. Cortez |
Inspirada
na obra de João Cabral de Melo Neto, a montagem não é uma adaptação de Morte e Vida Severina. “Em vez de falar
sobre a vida severina de que trata o poema, a gente resolveu colocar no palco a
personagem Severina”, revela o autor Will Damas.
A concepção inicial desta
produção foi de Mário Pazini, diretor e fundador do grupo. “Foi ele quem
encabeçou, incentivou e alimentou esta pesquisa desde os primeiros passos”,
explica a diretora Naruna Costa. O espetáculo é dedicado a Pazini, que faleceu
em 31 de março do ano passado, aos 51 anos.
Esta
peça integra um ciclo de encenações temáticas que refletem a questão nordestina
e a afro descendência em face da realidade periférica das grandes cidades. A
trilogia, sempre com base em textos de autores nascidos em Pernambuco, teve
início em fevereiro de 2008 com Hospital
da Gente, de Marcelino Freire, seguida de Urubu Come Carniça e Voa, de Miró da Muribeca, estreada em maio de
2011.
Os novos Severinos
Mário Pazini |
Diferente
de uma montagem paulistana que atualmente percorre teatros da capital, onde a
saga sofredora de Severino é transferida do agreste árido para o asfalto
agressivo, o Grupo Clariô mantém a trama em seu devido lugar – a terra rude do
sertão.
Quando
estávamos nos dirigindo para a porta de entrada do teatro, a poetisa Tula Pilar
brincou comigo, dizendo que a fila se assemelhava a uma procissão.
Na minha opinião, assistir espetáculos no Clariô é uma experiência religiosa.
Na minha opinião, assistir espetáculos no Clariô é uma experiência religiosa.
Foto: Maira Galvão |
Além
dessa impressão quase mística, a apresentação de Severina concede ao público uma interação olfativa com o cenário - o cheiro da
terra molhada. O chão do palco está coberto com terra natural suficiente para
se produzir sobre ela infindas caminhadas poeirentas, e até literalmente abrir uma sepultura no tablado.
Em cima dessa terra sedenta de
sangue, os personagens vagueiam sem rumo. Proibidos de ficar parados no solo
que não lhes pertence. Nem mesmo quando a terra passa a ser supostamente do
povo. Tem sempre alguém pra dar ordens. “Caminhem!”. O descanso é um pecado
cujo salário é a morte.
Mas nada de se abater diante de
perspectivas macabras. Há sempre o instante em que Severina aprenderá a dizer: “NÃO!”.
O novo espetáculo do Grupo Clariô é
uma celebração à Vida.
25 séculos de atraso
O
poema-espetáculo Morte e Vida Severina
foi escrito por encomenda da escritora Maria Clara Machado por volta de
1954-1955. Ela pediu a João Cabral para escrever algo sobre retirantes da seca.
A primeira apresentação da peça foi em 1957 por um grupo teatral no Pará. Em
1965 em São Paulo foi feita sua montagem mais celebrada, por ter sido musicada
pelo então jovem compositor Chico Buarque, na época com 21 anos.
Em
1977 a obra recebeu uma adaptação parcial para o cinema. Em 1981 foi convertida
em teleteatro pela TV Globo.
Em
2010 foi adaptada para animação em 3D, com direção de Afonso Serpa, sobre desenhos
de Miguel Falcão
Detalhe do cenário - Foto: André Piruka |
Comparado
ao ano de 1954 quando a peça foi escrita, hoje o nordeste brasileiro está mais
medonho. As capitais nordestinas são campeãs nacionais em mortes violentas. Como
diz um dos versos de João Cabral, “há sempre uma bala voando desocupada”.
A
presença do poder público é de fundamental importância no tipo de trabalho com
que o Teatro Clariô contempla a plateia.
Neste
sentido estamos 2.500 anos atrasados.
O autor Will Damas (de chapéu) - Foto: Wilson Cortez |
No ano
487 antes de Cristo, na Grécia as montagens das peças eram financiadas pelos
cofres públicos. Festivais de teatro faziam parte do calendário oficial. Os
espetáculos eram apresentados em um local a céu aberto na região sul de Atenas,
com lugar para até 17 mil pessoas. O preço do ingresso era baixo, e o governo pagava
a entrada para os atenienses mais pobres.
Decorridos
25 séculos daquela época, ainda não é sem sofrimento que o Grupo Clariô cumpre o
preconizado pelo poeta Solano Trindade: “Pesquisar na fonte de origem, e
devolver ao povo em forma de Arte”.
Severina - da Morte à Vida, de Will Damas. Direção:
Naruna Costa.
(inspirado
na obra de João Cabral de Melo Neto: “Morte e Vida Severina”)
Com: Alexandre Souza (João),
Martinha Soares, Naloana Lima e Washington Gabriel.
INGRESSO: Grátis
Espaço Clariô
Rua
Santa Luzia, 96 - (próximo ao hipermercado Extra Taboão e Hospital Family)
Taboão
da Serra
(11)
9995-5416 / (11) 4701-8401
de
08 de outubro a 08 de novembro
Quintas,
Sextas, Sábados, e Domingos às 20:30
*Ingressos são distribuídos uma
hora antes do espetáculo
Cenário e Luz: Alexandre
Souza (João). Cenotécnico: Rager Luan
Figurinos: Cleydson
Catarina e Martinha Soares. Maquiagem: Naloana
Lima
Bonecos: Rager Luan. Máscaras: Cleydson Catarina
Trilha Sonora
e Fotos:
André Ricardo. Vídeo/captação/finalização:
Wilson Cortez
Desenhos e
Projeto Gráfico:
Manu Maltez
Preparação
Corporal:
Rubens Oliveira
Técnicas
Circenses: Robson
Cruz
Aula de
Dunun / Musicalidade do Oeste da África: André Ricardo
Produção
Executiva:
Michele Andrade
Produção
Geral: Grupo
Clariô de Teatro
Agradecimentos:
Salloma
Salomão, Instituto do Tambor, Analy Alvarez, Jesuana prado, Flávia Mazal,
Leninha Silva, Thaise Reis, Renato Almeida, Ton Moura, Larissa Cristina,
Adriana Miranda, Rafaela Tamires, Rennan, Dona Margarida, Pablo Quiñones.
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