segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Silvio Modesto e o ultimo show do Cartola

O barbeiro Edgar e o dono do bar Carioca conversam com o sambista Silvio Modesto.
Foto: David da Silva - 28.nov.2015
Passei um sábado com S maiúsculo. S de samba. S de Silvio Modesto.
Convoquei o sambista Silvio Modesto para um bate-papo no Bar do Carioca, na Praça Luis Gonzaga, ao lado do Poupatempo/Pirajuçara. Ele não sabia (e só tá sabendo agora) por que foi convidado pra aquela conversa no amanhecer do último sábado, dia 28. É porque hoje se completam exatos 35 anos do falecimento do compositor Cartola. E eu tinha de reverenciar Cartola na manhã desta segunda-feira. E, enquanto escrevia mentalmente esta homenagem com a antecedência de um sábado, tinha de pegar na mão do homem que marcou o ritmo para Cartola cantar no último show gravado em disco na sua vida.
Silvio Modesto teve a glória de estar no palco com Cartola na sua última apresentação ao vivo. O imortal autor de As Rosas não Falam, de O Mundo é um Moinho, e outras canções que atravessaram gerações, teve seu derradeiro registro sonoro perante uma platéia em 30 de dezembro de 1978, dois anos antes de falecer. Ele morreu em 30 de novembro de 1980, vítima de câncer.

Cartola foi consagrado como autor a partir de 1929, quando “vendeu” seu primeiro samba, gravado por Francisco Alves, “o cantor das multidões”. Na década de 1960, depois de anos no ostracismo em que até o imaginaram morto, Cartola foi “ressuscitado” pelo jornalista Sérgio Porto (o Stanislaw Ponte Preta) e pela cantora Nara Leão. Em 1976, veio a primeira grande vendagem de uma composição de Cartola, na voz de Beth Carvalho.

Recorte de matéria que fiz sobre
Silvio, 12 anos atrás
Silvio Modesto
Se escondi do Silvio Modesto no sábado o porquê da sua convocação ao pé do balcão, ele, todavia não deixou de me surpreender. E ele sempre me surpreende. Anos atrás, fui à sua casa cumprimentá-lo por um aniversário. Ele foi até seus arquivos, e de lá sacou um gravadorzinho com que eu o havia presenteado há mais de década.
No sábado passado, Silvio trazia no bolso o recorte de uma matéria que fiz sobre ele em 2003.
Nossa conversa, escoltada pelo barbeiro Edgar e o dono do bar Carioca, rendeu até o meio da tarde. Além de excelente ritmista e compositor respeitado, Silvio é um grande enfeitiçador de público. Um contador de causos à altura da sua vasta biografia.
Depois do abraço da nossa despedida, e antes de tomarmos a saideira, beijei a mão do Silvio. Ele ficou meio assim... Mas fui-me embora sem lhe dar explicação. Agora ele sabe. Beijei a mão que tocou percussão para Cartola cantar no derradeiro show da sua passagem pela terra.

No disco acompanhado por Evandro e seu Regional (grupo onde Silvio Modesto foi ritmista por 17 anos) Cartola canta como uma entidade. 
Silvio Modesto (à esq.) com colegas músicos que
acompanharam Cartola em 1978
É arrepiante a formosura das suas modulações vocais. A dicção perfeita de Cartola é um encanto à parte, tal o seu apuro em escandir as sílabas. Os arranjos musicais feitos com singela sofisticação, mostram que os acompanhantes tiveram a correta leitura de um homem que estava prestes a cumprir sua missão na forma humana.

As pessoas na plateia, e os músicos no palco, viveram com Cartola naquela noite uma experiência que não se explica com meras palavras.
Gravado em 30/12/1978
Local: Ópera Cabaré – São Paulo (SP)
Voz: Cartola
Bandolim: Evandro do Bandolim
Violão 7 cordas: José Pinheiro
Cavaquinho: Lúcio França
Percussão: Silvio Modesto e José Reli (Zequinha)

00:00 - Alvorada (Carlos Cachaça/Cartola/Hermínio Bello de Carvalho)
03:46 - O mundo é um moinho (Cartola)
07:57 - Sim (Cartola/Oswaldo Martins)
11:46 - Acontece (Cartola)
14:46 - Amor proibido (Cartola)
18:59 - As rosas não falam (Cartola)
22:37 - Verde que te quero rosa (Cartola/Dalmo Castelo)
25:28 - Peito vazio (Cartola/Elton Medeiros)
28:55 - Alegria (Cartola/Gradim)
31:14 - Inverno do meu tempo (Cartola/Roberto Nascimento)
34:18 - O sol nascerá (Cartola/Elton Medeiros)

Nenhum comentário: