segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Gualaxo do Norte: o rio que mal nasce, começa a morrer

Com 60 quilômetros de comprimento, este rio está morto em 48 quilômetros da sua extensão
Rio Gualaxo do Norte já sofria degradação causada pela mineração e venenos agrícolas. Suas águas hoje contêm substâncias prejudiciais à vida dos peixes e dos humanos. A flora subaquática está totalmente destruída.  
Foto: David da Silva – 20.out.2017
David da Silva

Contar a história da cidade de Barra Longa (MG) é contar a história dos seus rios. Se hoje sua base econômica é a pecuária leiteira, foi o garimpo do ouro que atraiu as primeiras pessoas para a região onde o Rio do Carmo se encontra com o rio Gualaxo do Norte. 
O próprio nome do município vem deste fenômeno geográfico. As águas do Carmo ‘caminham’ juntas sem se misturar com as do Gualaxo por um trecho muito longo – vem daí: Barra Longa.
O Gualaxo foi a viatura líquida que primeiro recebeu a lama com rejeitos de minérios despejada pela Samarco no dia 5 de novembro de 2015. O impacto foi tão forte que ao cair no leito deste rio a lama alcançou 15 metros de altura, e subiu seis quilômetros na contracorrente.
Nos trechos mais estreitos do rio, o lamaçal atingiu 40 metros de altura; nos lugares mais planos, se esparramou por um quilômetro de largura. O mar de lama demorou 12 horas para ir da Barragem de Fundão até Barra Longa, cerca de 60 quilômetros de distância.
A Samarco não enviou nenhuma mensagem aos barra-longuenses avisando-lhes que a marcha fúnebre da lama avançava sobre o município.
As águas limpas do Rio do Carmo (à esquerda na foto) lutaram com a lama trazida pelo Rio Gualaxo. A imundície venceu. Foto: Gustavo Basso – 07.nov.2016
Ao desembocar no Rio do Carmo, o Gualaxo do Norte empurrou a carga lamacenta rio acima. “Quando o Gualaxo despejou a lama aqui, a lamaceira foi tão brava que ela subiu dois quilômetros até o lugar chamado Capela Velha, e a água ficou represada mais uns três quilômetros aí pra cima”, relembra o taxista Darci Humberto de Castro, de 54 anos, natural de Barra Longa.
A região de Barra Longa mais devastada pela lama transportada pelo Gualaxo do Norte foi a zona rural Gesteira Velho. Durante todo o tempo em que circulei por este distrito a 15 km do centro, só vi funcionários da Samarco fazendo reparos em fazendas de grandes proprietários. Os agricultores humildes do Gesteira Velho esperam até hoje a indenização por perderem suas plantações e suas poucas cabeças de gado. Moram em casas de parentes ou de aluguel pago pela mineradora. O reassentamento total dessas famílias desabrigadas só vai acontecer em 2019.

Embarcação pirata de garimpo presa pela PM 
em Barra Longa no mês de fevereiro de 2017. 
A garimpagem do ouro envenena o curso d’água 
com mercúrio e arsênico que contaminam 
as pessoas. Foto: Polícia Militar/MG
Envenenado no berço

Uma das maiores autoridades científicas sobre o rio Gualaxo do Norte, a professora Adivane Costa ensina que antes mesmo do desastre-crime da Samarco, este rio já era um cadáver.
Seus estudos detectaram altos índices de amina, substância cancerígena usada no beneficiamento do ferro. Também encontrou na água do Gualaxo substâncias que diminuem o nível de oxigênio e impede a existência de peixes.
"A soda cáustica, a amida e a amina são solúveis na água; nenhuma barragem consegue contê-los", explica Adivane.

Condenado ao nascer

Ao sair da sua nascente, o rio Gualaxo do Norte não demora mais do que 500 metros para entrar na mina Timbopeba. Percorre seis quilômetros dentro da mina que funciona dia e noite. Dali são mais seis quilômetros até o local onde recebeu toda a imundícia dos 62 bilhões de metros cúbicos de lama com lixo da mineração. O pouco que ainda há de vida no Gualaxo está aprisionado nestes 12 quilômetros.
Relatórios sobre a atual condição do Gualaxo do Norte citam que ele está com produtos químicos prejudiciais tanto aos peixes quanto aos humanos.
A pesquisadora Flora Juncá faz um prognóstico sombrio: “Há indícios de que pessoas estão sendo contaminadas. O problema da contaminação por metais é que a maioria das pessoas só vai ter sintomas daqui a 15, 20 anos”.

Quando o corpo humano acumula muitos metais, pode gerar mal de Parkinson, úlceras, câncer de pulmão. O chumbo fica retido nas articulações, podendo causar paralisia. Outros metais encontrados no rio Gualaxo do Norte podem prejudicar o sistema digestivo, e causar danos ao sistema nervoso.
A lama da Samarco terminou de matar o pouco de vida que ainda resistia no Rio Gualaxo do Norte. 
Foto: Dante Pavan

3 comentários:

Lidia disse...

Que triste mas que importante saber!

Carlos Silva disse...

O que.mais revolta,é saber que os locais DESTRUIDOS pela ini competencia desses canalhas,Kátia volta da a ser o que um dia foi.
O Brasil SE ABRE TODO feito quanta para o capital estrangeiro. É muitos vivem falando da PODRIDÃO POLITICA é já se esqueceram o que esta MALDITA SAMARCO fez com os nossos irmãos

O rio doce morreu. Os rios curados nessa reportagem do Davi, jamais voltarão ao curso e atividade normal
Um monte de dada dos,incompetentes aproveitadores,destruidores do nosso meio ambiente,escapam da pena pagando fortunas,como se dinheiro fosse devolver o verde,os rios,os peixes e a dignidade dos habitantes que estavam na rota da destruição causada pela Samarco.Se esse puteiro a céu aberto chamado BRASIL tivesse HOMENS NOS.PODERES, as coisas seriam diferentes.


Carlos Silva

Suzi disse...

Que tristeza toda essa lama, seja do barro, seja a lama ainda mais podre escondida por trás de tudo isso. Pior é saber que neste país ninguém é punido por seus crimes, principalmente quem tem dinheiro.