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sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Domingo será Tempo de Amor

Show reviverá o amor como tema dos sambas do violonista Baden Powell com o poeta Vinícius de Moraes.
20 de novembro (domingo) – 15 horas
Ingresso: Grátis
AABB (Associação Atlética Banco do Brasil)
Estr. de Itapecerica, 1935 (Metrô Campo Limpo)
Fone: 5511-9555

Abaixo, uma das músicas do repertório:
Primeira gravação de Samba em prelúdio, em 1962, c/ Geraldo Vandré e Ana Lúcia
Samba em Prelúdio
Baden Powell / Vinícius de Moraes

Eu sem você não tenho porque
porque sem você não sei nem chorar
Sou chama sem luz, jardim sem luar
Luar sem amor, amor sem se dar

Eu sem você sou só desamor
um barco sem mar, um campo sem flor
Tristeza que vai, tristeza que vem
Sem você meu amor eu não sou ninguém

Ah, que saudade!
Que vontade de ver renascer nossa vida
Volta querido, os meus braços precisam dos teus
Teus abraços precisam dos meus

Estou tão sozinha
tenho os olhos cansados de olhar para o além
Vem ver a vida
Sem você meu amor eu não sou ninguém

sábado, 25 de junho de 2011

Baden e Vinicius reconquistam SP com Cia. Jazzcira

Foi na cidade de São Paulo onde Baden Powell e Vinicius de Moraes deram os retoques finais a Canto de Ossanha, o afrossamba mais famoso da parceria – apresentado pela primeira vez ao público pelos próprios autores em 13 de dezembro de 1965 no Teatro Municipal paulistano.
Pode-se também creditar a São Paulo o berço de Formosa, outro grande sucesso de Baden e Vinicius, que começaram a compô-lo no trem a caminho da capital paulista, em 1963.
Foi ainda em São Paulo que a dupla teve sua primeira farra “fora de casa”. Após um recital no Colégio Mackenzie em 1962, Baden e Vinicius permaneceram por cinco dias de boemia ininterrupta na terra da garoa.
Sem contar que foi em São Paulo onde Baden Powell se apresentou (com apenas 16 anos de idade!) ao lado de velhos bambas como Pixinguinha, João da Baiana, Donga, etc., nos festejos do IV Centenário paulista, em 1954.
Cia. Jazzcira - Foto: Guma
Por isto, nada mais justo que tenha partido de São Paulo a comemoração do 45º aniversário de lançamento do legendário disco Os Afrossambas, e do cinqüentenário da amizade entre o poeta e o violonista.
A Cia. Jazzcira de Repertório está em cartaz com O Amor nos Tempos de Baden e Vinicius, um espetáculo embrionário da turnê multimídia Afrossambas 45 Anos, em fase final de produção.
O Amor nos Tempos de Baden e Vinicius já percorreu os quatro pontos cardeais do município de São Paulo, com direito a uma “esticada” a Taboão da Serra, no sudoeste da região metropolitana.

Imprecisão mágica
Em Baden e Vinicius tudo é meio vago, lendário.
O poeta dizia ter conhecido Baden no início de 1962, na boate Arpège, no Leme, zona sul do Rio, após uma apresentação de Tom Jobim.
Mas Jobim já estava consagrado em 1962, e sua fama não caberia mais na Arpège. O show de Tom naquela boate foi provavelmente em 1960.
Esta última data confere com as memórias de Baden: "Era 1959, conhecia Vinicius só de nome. Uma noite, Vinicius apareceu no Arpège, em que eu só tocava boleros com um conjunto e depois vinha o show principal", declarou ao jornal "O Globo", em março de 2000.
O impacto foi forte em Vinicius: "Quando o conjunto retomou as danças, vi alguém se aproximar dos músicos e, dentro em pouco, a sala se enchia de sons de improviso de jazz em guitarra elétrica. Era Baden e ele estava com a cachorra, fazendo misérias no instrumento", contou o poeta.
Henrique Barros, produtor artístico da Cia. Jazzcira optou por 1961 como gênese da criação Baden/Vinícius, por ser a data em que seus nomes aparecem pela primeira vez em selo de disco (Um Violão na Madrugada, da Phillips).

“Profundamente marginais”
Imprecisões à parte, semanas depois de se conhecerem na boate Arpège o poeta e o violonista tiveram o primeiro “encontro de trabalho” no bar do Hotel Miramar – não sem antes Baden ter faltado aos três encontros marcados anteriormente.
Nunca sem seu violão a tiracolo, Baden sacou do bolso umas partituras rascunhadas com músicas suas. Adepto da música clássica, ele preferia o pentagrama ao gravador. Naquela mesa de bar nasceram Cantiga de ninar meu bem e Sonho de Amor e Paz.
O furor criativo da dupla prosseguiu no belo e imenso apartamento de Vinicius, no Parque Guinle. Dali brotaram clássicos como O Astronauta, Labareda, Tem dó, Só por Amor, Consolação, e outros. Tudo embalado pelo consumo de uísque “em quantidade federal” (na definição de Vinicius) e noitadas reforçadas por mexidinho de ovos com bacon.
Para evitar o cansativo trajeto Olaria-Parque Guinle, durante o qual Baden sempre desmaiava de sono e perdia o ponto de descer, o músico ficou “morando” na casa do poeta durante 90 dias e 20 caixas de uísque.
A fascinação de Vinicius por Baden era imensa. O violonista trazia dentro de si a alma suburbana de que o poeta tanto gostava. Acrescida do gosto comum pela bebida (Baden trazia no sangue o DNA alcoólico herdado do pai). A comunhão dos parceiros foi tanto mais arrebatadora porque ambos eram “profundamente marginais”, na definição da biógrafa Dominique Dreyfus.
Se Vinicius influiu decisivamente na ascensão social de Baden, foi graças a uma composição da dupla que Vinicius concretizou seu desejo de cantar profissionalmente, estreando como cantor na boate Au Bon Gourmet interpretando o então inédito Samba da Benção, em 1962.

Interpretações sólidas
O repertório do show da Cia. Jazzcira está solidamente edificado entre dois poderosos afrossambas. A apresentação começa com Canto de Xangô, e se encerra, no inevitável bis, com Canto de Ossanha.
Com personalidade vocal marcante, as cantoras Daisy Cordeiro, Paula Souto e Susie Mathias provam que, para cantar Baden e Vinícius não basta interpretar – tem de incorporar toda a paixão e alegria contidas nas composições concebidas em meio a tristeza e sofrimento.
Os cinco instrumentistas surpreendem pela juventude da qual emana a maturidade musical adequada a quem aceita o desafio de levar ao palco uma obra desta magnitude.
O diretor musical, arranjador e violonista Igor de Bruyn ratifica a sentença de Vinicius: “o violão é a música em forma de mulher ideal, nem grande, nem pequena; de pescoço alongado, ombros redondos e suaves, cintura fina e ancas plenas, relutante em exibir-se, a não ser pela mão daquele a quem ama”.
Entremeadas a consagrados afrossambas lançados em 1966, O Amor nos Tempos de Baden e Vinicius traz canções pungentes que os dois fizeram ao longo da parceria que rendeu mais de meia centena de clássicos como Apelo, Formosa, Queixa, Pra que chorar?, Tem dó, e outros.

Cabem uns “causos”
Com todas as decisões tomadas em coletivo, elenco e produção do espetáculo planejam intercalar as músicas de O Amor nos Tempos de Baden e Vinicius com bastidores da parceria.
Baden e Vinicius eram capazes de ir da alegria extremada à mais profunda depressão.
No mesmo dia de Natal de 1963, nasceram composições diametralmente opostas. Durante a preparação do peru do almoço no apartamento de Vinicius em Paris, Baden aproximou-se do parceiro. É Vinicius quem conta: “Durante o cozimento da ave, meu parceiro Baden Powell sobreviera e ali mesmo, ao pé do fogão, balançara-me um samba também saidinho do forno; um sambão todo alegria, de bocarra aberta e braços para cima. Enquanto trançávamos entre a cozinha e a sala, dando as últimas providências, a letra foi saindo...”. Baden e Vinicius certamente trocavam olhares sacanas enquanto “pariam” o samba Formosa, inspirado numa mulata de seios e bunda colossais que conheceram dias antes no trem Rio-São Paulo.
Na tarde daquele mesmo 25 de dezembro de 1963, os dois estavam abraçados no meio da sala, chorando desesperadamente ao término da composição de Velho Amigo, dedicada ao falecido pai de Baden.
No ano anterior a este fato, Baden entregou a Vinicius a melodia do que viria a ser Samba em prelúdio. O poeta refugou para pôr a letra. “Isto é plágio de Chopin”, disse ao parceiro contrafeito. Vinicius era então casado com uma pianista que conhecia Chopin “na ponta dos dedos”. Ante a negativa da mulher, o poeta tripudiou: “Então esta é uma música que Chopin se esqueceu de compor”.
Vinicius havia errado de autor, mas acertara na acusação. Samba em prelúdio é, sim, um plágio. Não do polonês soturno. Mas do brasileiro Heitor Villa Lobos. A primeira parte de Samba em prelúdio é “chupada” do Prelúdio da Bachiana número 4. O que não impediu este samba de entrar para a história como uma das mais lancinantes obras do cancioneiro brasileiro.

De norte a sul
O Amor nos Tempos de Baden e Vinicius já foi apresentado nas seguintes localidades:
  • Zona Oeste - Biblioteca Alceu Amoroso Lima, Pinheiros, em 25.mar.2011
  • Zona Leste - Biblioteca Cora Coralina, Guaianazes, em 29.mai.2011
  • Zona Norte - Biblioteca Álvares de Azevedo, Vila Maria, em 26.mai.2011
  • Zona Sul – Biblioteca Viriato Correa, Vila Mariana, em 27.abr.2011, e C.E.U. Navegantes, Grajaú, em 24.jun.2011
E como Baden e Vinicius eram “chegados num uisquezinho”, a Cia. Jazzcira também levou o show ao Bar Varal, em Pinheiros, zona oeste, em 25.jun.2011.

Elenco:
Adriana Aragão – Percussão
Daisy Cordeiro – Voz
Edson Luna - percussão
Edson Negrita – Cavaquinho
Igor de Bruyn – Violão 7 cordas
Mathias Capovilla – Trombone
Maurício Paixão – Percussão
Paula Souto – Voz
Susie Mathias – Voz
ViniBatucada – Percussão

Para contratar O Amor nos Tempos de Baden e Vinicius:
55 (11)  3784-4031 / 8435-5229 – Henrique Barros

Visite o site do show e o perfil no Facebook
Vinicius e Baden em Paris - Revista O Cruzeiro, 31.out.1964

domingo, 24 de abril de 2011

Baden Powell, o Semideus

Para Ygor de Bruyn e Cia.

Faltam só três dias para a nova apresentação do show O Amor nos Tempos de Baden e Vinícius
Vou administrar minha ansiedade mandando e-mails para a TV Globo sugerindo, insistindo, rogando que reprisem a novela Semideus.
Não por paixão desenfreada às telenovelas. Mas, porque esta novela escrita por Janete Clair, e exibida entre agosto/1973 e maio/1974, tinha a trilha sonora nacional só e exclusivamente com composições do violonista imortal Baden Powell com letras do eterno em vida Paulo Cesar Pinheiro.
Nem preciso dizer o prazer de assistir um novelão envolto na atmosfera mágica musical do Baden.
Por isto esta postagem é dedicada ao Ygor, à Rafaela, à Adriana, à Camila, à Grá, à Luca, à Marília, à Paula, à Renata, ao Vini, ao Maurício, ao Negrita e ao Henrique.
Da trilha de Semideus sirvo-lhes como petisco isto:
Eu não tenho ninguém
 -c/ Cláudia Regina
Pra judiar de vez, vai aí o original do Baden com vocalização da arrebatadora Jeanine de Waleyne:
Faixa do disco L’Âme de Baden Powell, gravado na França em dezembro de 1972.
Ai, o amor
Quem tem
Deve dar valor
E eu não tenho ninguém
Já quis ter um bem
Deus me recusou
E eu não tenho ninguém
Ah, não tenho ninguém

Se a tal felicidade
Pra todo mundo vem
Meu coração por que é que é tão só solidão?
E eu não tenho ninguém
Eu não tenho ninguém

E a infelicidade eu já conheço bem
Toda paixão que ao peito vem é ilusão
E eu não tenho ninguém, ai
E eu não tenho ninguém
Eu não tenho ninguém...

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Descabelado, confuso e entupido de dólares

Fazia um friozinho chato no aeroporto de New York naquele abril de 1971. O violonista e compositor Baden Powell faria ali uma conexão no vôo que o trazia de Tokyo.
De repente, como num dos seus improvisos fantásticos ao violão, ele resolveu visitar o amigo Sivuca, que na época trabalhava em New York com Miriam Makeba, cantora sul africana. Sivuca havia sido colega de Baden quando tocavam juntos em bailes cariocas na década de 1950. O violonista queria ficar um ou dois dias com o velho amigo.
“Como é que eu faço pra pegar minha bagagem e trocar a passagem?”, se perguntava Baden Powell, que não sabia uma vírgula em inglês. Um dos guardas do aeroporto ficou de olho naquele moreno todo descabelado (ventava no JFK), com um casacão que lhe descia até os calcanhares. Quando o policial se aproximou, Baden enfiou a mão no bolso do casaco, para apresentar-lhe o passaporte. Ao invés do documento, o que saiu do casaco imenso foi uma montoeira de dólares. Quanto mais Baden fuçava nos bolsos em busca do bendito passaporte, mais lhe saiam notas de dólares. Dezesseis mil dólares, se você quer saber... “Te peguei, ladrão!”, vibrou o meganha.
Tiveram de chamar uma pessoa do FBI que entendesse português. Baden explicou que aquela pacoteira de grana era parte de um cachê de 30 mil dólares que acabara de receber no Japão – Baden só gravava disco se pintasse grana viva, nada de cheque, e tudo à vista. “Tá aqui o recibo!”, disse o músico trinfante. Mas... o recibo estava escrito... em japonês. Toca os “hômi” irem atrás de quem sabia a língua nipônica. O policial de olhos puxados lê o recibo, balança a cabeça, tudo certo, é isso mesmo, Baden liberado...

Um violão na terra dos samurais

A ida (ou melhor: o retôrno) de Baden Powell a Tokyo em abril de 1971, foi devido à insistência de um produtor japonês de discos. Baden tocou no Japão pela primeira vez em 26 de setembro de 1970. A temporada dele com seu quarteto por lá se esticou até outubro daquele ano, quando Baden gravou acompanhado por três músicos japoneses a canção Itsuki-no-Komoriuta, folclore datado de meados do século 16.
Aquela gravação enfeitiçou o país, e imprimiu o nome de Baden Powell - em japonês:  バーデン・パウエル  - nos corações e mentes dos nipônicos.
A gravadora japonesa Canyon pelejou por mais de um ano para contratar Baden. Até que usaram um argumento poderoso: U$S 30 mil (trinta mil dólares, sim senhora!) para Baden gravar 30 músicas – tá bom pra você mil dólares por música? Pro Baden estava. E lá se foi ele para a terra dos samurais armado com seu violão Di Giorgio modelo Author 3, feito especialmente para ele.
 Chegando a Tokyo, Baden procurou o produtor para acertar detalhes da gravação. “Que músicas você quer?”, perguntou. “Como assim?”, devolveu o nipon. “As músicas! E cadê os músicos?”. “Hããã???”. O dialógo estava ficando impossível. Até que o produtor passou uma lista de composições japonesas modernas. “Isto aqui qualquer um pode gravar!”, protestou Baden. Mas o japonês queria-porque-queria que fosse o colossal Baden Powell a dedilhar aquelas musiquinhas. E tinha aquela bufunfa toda esperando na porta do estúdio.
Levaram Badéco pra gravadora, que ficava muito longe do centro da cidade, bem pra lá dos cafundós de Tokyo. Nenhum bar por perto... Antes de mandar o técnico apertar o play, Baden teve de andar um bocado até achar um boteco onde comprar o whisky pra temperar o ambiente. “Cadê os músicos?”, voltou a perguntar Baden. O japonês disse que a orquestra já tinha gravado a parte dela - era só ele colocar o violão em cima, e fim de papo. Das 30 músicas gravadas, 14 delas foram aproveitadas no disco Shiretokoryojou – Hanayome, uma relíquia fonográfica que só vale porque botou 30 mil mangos com a cara de George Washington no bolso do nosso herói do violão.

Sayōnara, Badéco!

A afeição dos japonêses por Baden foi instantânea. Badéco (assim o chamava Vinícius) voltou muitas vezes a Tokyo; numa das últimas, levou os filhos Philippe e Marcel.
A ligação nipônica com a obra de Baden pode ser medida pelo fato de a regravação de 1990 dos Afro-Sambas ter sido lançada primeiro lá, e somente anos depois aqui no Brasil.
Baden ensinou aos nipônicos o que é berimbau ビリンバウ
E até fazer saudação com um sonoro Saravá!  サラヴァ

Jornal japonês de 27.set.2000 noticiando a morte de Baden no dia anterior

domingo, 26 de setembro de 2010

Há 10 anos, o Violão Vadio emudeceu

Iniciamos amanhã a primeira década do resto das nossas vidas sem a presença física do músico Baden Powell.
No último 26 de agosto, a Rádio Samba de Alambique homenageou a data de nascimento do imortal compositor. Hoje faz o tributo ao maior violonista do mundo em todos os tempos.
Do Baden Powell você pode ler muitas histórias aqui.
E muitas outras há de ler no decorrer dos próximos dias.
A música favorita de Baden era Refém da Solidão, feita em parceria com Paulo César Pinheiro.
Em 1969, Baden se divorciou de Teresa Drummond, com quem vivia há quatro anos.
Dessa sua fase conturbada brotaram sambas colossais.
Paulo Cesar Pinheiro, então com 20 para 21 anos, já estava habituado, desde seus 17 anos, a converter em palavras o que Baden queria dizer pelas pontas dos dedos. Foi deste jeito que nasceu um dos sambas mais sólidos da história da nossa música brasileira. Refém da Solidão foi gravado pela primeira vez em 1970, por Elizeth Cardoso.
Ouça esta maravilha na voz da eterna Elizeth acompanhada pelo violão do próprio criador, num programa da TV Globo em 1986. Enquanto a Divina canta, o violão vadio de Baden não deixa uma única molécula do ar inteira.

sábado, 26 de setembro de 2009

Ecos do Baden na Escandinávia

Num domingo de sol em Oslo – 2 de agosto - eu seguia no carro do Arne Karlstad em direção ao Frognerparken. Conosco ia a doce Randi Faerden.
Ao passarmos diante de um determinado prédio, o Arne apontou:
- David, naquele apartamento deve morar algum brasileiro. Porque eu sempre vejo a bandeira do Brasil naquela janela quando tem jogo da Seleção.
Randi foi secretária da Embaixada Brasileira na Noruega. Sabe tudo de Oslo:
- Ali mora o percussionista brasileiro Alfredo Bessa – explicou Randi. – Ele é casado com uma norueguesa.
Dei um pulo no banco. Alfredo Bessa foi o percussionista favorito do violonista Baden Powell. Tocaram juntos na melhor fase do músico que revolucionou a arte de tocar violão (na foto, Baden e Alfredo na capa de um disco lançado em 1970).
Alfredo está com 76 anos. Vejo alguns vídeos dele no Youtube tocando com amigos no Bar Brasil, na capital da Noruega. Também desenvolve um trabalho de terapia musical numa instituição do governo local.
Não pude parar alí para cumprimentar o companheiro do meu violonista imortal. Um ônibus já me esperava para ir a Sandefjord. Quando eu voltar a Oslo, vou procurar Alfredo Bessa para uma entrevista.

Um mês antes deste episódio, eu estava na Finlândia, onde conheci o baterista Matti Koskiala. Ele é um entusiasta da música brasileira. Uma postagem sobre Matti está agendada para as próximas semanas aqui no nosso blog-boteco.
Matti Koskiala me contou que assistiu Baden Powell em Helsinki no ano de 1975:
– Só não deu pra falar com ele – lamentou Matti. – O Baden passava o dia inteiro bêbado. Só saia do quarto para o bar do hotel, e dali para o palco. Mas fez dois concertos inesquecíveis aqui.

Na década de 1970 o empresário de Baden Powell era o suíço Daniel Bakman. Na sua temporada na Escandinávia, Baden tocou na Finlândia, na Dinamarca e na Suécia. Estava no auge de sua capacidade técnica de instrumentista. Sua grande explosão criativa foi na década anterior. Seu violão era do tamanho do mundo. Não cabia só no Brasil. Dos 70 discos que gravou, 60 foram feitos no exterior.
Estou contando isto hoje, porque foi numa data como esta que o Brasil perdeu seu maior violonista de todos os tempos. Baden morreu na manhã de 26 de setembro de 2000. Matou-o uma infecção generalizada decorrente de pneumonia bacteriana grave. Estava há 33 dias na UTI da Clínica Sorocaba, padecendo sessões diárias de hemodiálise e respiração por aparelhos. Sua falência renal aguda foi o tributo que o álcool cobrou do mestre das cordas. Foi Vinícius de Moraes quem apresentou Baden Powell ao copo. As bebedeiras a que o músico finlandês se referiu acima eram uma constante na vida de Baden. Volta e meia, sumia de casa por vários dias, enfurnado nos botequins mais improváveis. A família só conseguia resgatá-lo com a ajuda de jornalistas ou da polícia.
Baden esteve abraçado ao bojo do violão desde os 4 anos de idade. Morreu com 63 anos.
Seu corpo desceu à sepultura às 14h da 4ª-feira 27.set.2000.







Baden Powell: A Lenda do Abaeté, de Dorival Caymmi (Grav. 1969)

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Encantamentos ao violão em torno de Dora

A primeira vez que eu vi o Baden Powell tocando Dora, do Dorival Caymmi, foi em 1989, num show que ele fez aqui em São Paulo, se não me engano no Circo dos Bancários.

Me encantou a inserção que ele fazia repetindo o toque do clarim no trecho específico da canção.

Baden gravou Dora pela primeira vez no lendário disco Baden Powell Quartet Volume 1, gravado na França entre os dias 10 e 12 de dezembro de 1970, para a gravadora Barclay.

Em maio de 2000, quatro meses antes de morrer, ele lançou o CD Lembranças, um álbum meditativo, como que anunciando sua despedida, e nele reapareceu Dora com mais novidades. Além do toque do clarim, Baden adicionou uma introdução evocando O Mar, do próprio Caymmi. “Acho que a inspiração lhe ocorreu quando afinava o violão", comenta Fernando Faro, no vídeo promocional que dirigiu para o último trabalho do imortal violonista.

Ouça a gravação de 1970

domingo, 17 de agosto de 2008

Domingo é dia de Baden Powell

No domingo que vem, 24 de agosto, Baden Powell será o personagem da coleção da Folha de São Paulo sobre a bossa nova. Freqüentadores do nosso boteco sabem, à exaustão, da minha paixão insana pela obra deste músico maiúsculo e ímpar.
Pelo jeito não estou sozinho. Quem redigiu a nota da Folha anunciando o próximo fascículo, caprichou
no texto, fazendo-me perceber nas entrelinhas uma igual devoção ao inigualável violonista: “Não são poucos os especialistas e músicos que o consideram o maior violonista brasileiro de sua época, ou mesmo o melhor do mundo. Instrumentista de técnica perfeita, capaz de tocar nos andamentos mais velozes, ele combinou modernidade e tradição em seu estilo. Era como se, praticamente, toda a história do violão brasileiro saísse das cordas de seu instrumento.”
A pessoa que escreveu isto, nunca, jamais e para-todo-o-sempre terá de pagar nada neste nosso humilde e comovido boteco imaginário.

Betty Faria no terreiro de Baden

Só fiquei sabendo que a atriz Betty Faria faz parte da obra do nosso idolatrado Baden Powell, um dia depois que ele morreu. Este fato ficou por quatro décadas fora do meu conhecimento por culpa de quem datilografou (atenção revisão: na época não tinha computador! A gente batucava forte nas saudosas Olivetti, Remington, etc) a ficha técnica do disco com os afro-sambas de Baden e Vinícius de Moraes. Tá lá: Vocais - Vinicius de Moraes, Quarteto em Cy e Coro Misto. Só que no danado deste “coro misto” estavam Nelita e Teresa Drummond, Eliana Sabino (filha do escritor Fernando Sabino), Otto Gonçalves Filho, César Proença e... uma jovem aspirante a atriz chamada Betty Faria. Quando não descolava um trabalho onde representar, Betty fazia uns bicos cantando.
No estupendo Canto de Ossanha, é ela quem divide os vocais com o Poetinha. Vinícius canta como no murmúrio de uma súplica, e Betty reforça as sílabas finais de cada verso com sussurrante sensualidade. O lendário disco foi gravado entre os dias 3 a 6 de janeiro de 1966. 

Pena que Baden não gostou. O maestro Guerra Peixe escolheu dar à gravação uma sonoridade rústica, como se fosse feita mesmo em um terreiro. Baden achou isto uma bosta (embora em público usasse a expressão “mal gravado”) e regravou 11 daqueles afro-sambas com outros músicos na década de 90.

quarta-feira, 11 de junho de 2008

Hoje tem Baden na Sesc TV

Nosso imortal Baden Powell é o homenageado desta quarta-feira, às 23h, na Sesc TV, dentro da programação Instrumental Sesc Brasil.
É a primeira parte do projeto Obra Viva, realizado no Sesc Pompéia no ano de 2006.
O show foi dirigido pelos endiabrados violonistas do Duofel, com participação de Paulo César Pinheiro, Chico Pinheiro, Marcel Powell, Natan Marques, Maurício Carrilho, Quarteto Maogani, Paula Morelembaum, Dalila Couti e Yamandu Costa.
Se você estiver grudado no jogão de bola Sport x Curíntia (dá-lhe, Sport!!!) não tem problema. O programa será reprisado amanhã (12/06) em horários dignos a quem vive na boemia: às 4h da matina, e às 16h30.
O SescTV está disponível via Sky no canal 3, na Direct TV no canal 211, na TecSat no canal 10 e através de sinal digital no Satélite B3 freqüência 3768-V. Em São Paulo e Rio de Janeiro a emissora também está disponível via Net Digital no canal 92.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

O dia em que Baden Powell “quebrou” o braço

De 1968 a 1983, Baden Powell morou em Paris – em 1995, voltou a montar residência lá. E levou seu violão por todos os recantos da capital da França. No livro da jornalista Dominique Dreyffus – O Violão Vadio de Baden Powell, 1999, Editora 34 – é possível você conhecer as ruas da Cidade Luz seguindo os passos do imortal violonista.
Quando não estava gravando, fazendo show ou praticando (passava religiosamente de 6 a 8 horas por dia treinando no violão), Baden se enfiava pelos botequins parisienses. E nem sempre eram locais recomendados para artistas do seu renome.
Não raro, a mulher de Baden pedia ajuda à polícia, para ir buscá-lo em tavernas infectas, onde Badéco era capaz de varar madrugadas, tragando uma quantidade industrial de whisky.
Certa manhã, seu empresário o aguardava no estúdio, acompanhado por quase uma centena de outros músicos e jornalistas, especialmente convocados para o acontecimento: Baden iria gravar Garota de Ipanema. A hora avançava, e nada de Baden. Nervoso, o produtor liga para sua casa. Um ressaqueado Badéco atende: “Rapaz, bebi tudo ontem à noite. Não consigo tocar nada hoje”, desculpou-se. “O que faço com todos estes convidados?”, desesperou-se o empresário. “Diga que eu quebrei o braço.” “Como vai quebrar o braço hoje e tocar amanhã?”, insistia o homem, mas o telefone já pendia inerte das mãos gloriosas do gênio.
Dia seguinte, lá foi todo aprumado nosso deus das cordas, fazer a mais esplêndida gravação da canção de Tom e Vinícius. Assista uma das muitas versões que Baden deu à canção-símbolo da Bossa Nova.

Baden continua a fazer milagres

Já contei aqui, aqui com o cotovelo enfiado no balcão imaginário, como entrei em contato com a arte do maior violonista de todos os tempos, Baden Powell.
Pois foi publicado ontem, num site de notícias da Suíça, que uma linda nativa daquela terra rendeu-se à Música Brasileira exatamente pelo som do Mestre. Acompanhe o relato do jornalista Alexander Thoele: “A vida da adolescente decorria normalmente até o dia em que ela começou a vasculhar a coleção de discos do pai e descobriu um com uma capa interessante. Quem seria Baden Powell? O achado se transformou em mágica sonora ao colocar a bolacha na vitrola. O efeito das cordas dedilhadas pelo virtuoso violonista e compositor brasileiro, a voz suave das parcerias e principalmente as nuances do português, esse idioma tão exótico para seus ouvidos, foi fulminante.”
Leia o que aconteceu depois deste
encontro da cantora Jenny Chi com o som insuperável do Badéco.
Abaixo, num brinde da casa, um pouquinho desta deliciazinha suíça em Esperança Perdida, de Tom Jobim e Billy Blanco.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Versos para o homem feito de madeira e cordas

Nem imaginava o quanto Michel Legrand (esq.) gostava do nosso Baden. Pois navegando pelaí achei este manuscrito do grande maestro francês dedicado ao nosso violonista imortal.
Dentro de nós há música
Acima de nós está a imortal, a imensa música
Mais alto ainda,

há aqueles que a derramam,
que a expandem
E no topo disso
Há Baden Powell
Homem genial
Homem em forma de cordas de violão
que faz descer seu sangue até nós
dentro da sua música
nossa música
nossa vida.

E toda vez que nos deparamos com versos, não há como não lembrar de Vinícius, uma das pessoas mais importantes na existência imensa do nosso incomparável mestre das cordas. Segue aí a benção de Vininha para o Badéco:

“A benção, Baden Powell, maravilhoso duende da floresta afro-brasileira de sons, gênio bom da moderna canção popular.
Você para quem o violão é a única arma de combate ao desamor,
ao convencionalismo e à indiferença.
Você cuja música dá tristeza e faz pensar.
- Parceiro exemplar que vai devagar e sempre ganhando o coração do mundo…
… a benção, Baden!"

domingo, 20 de abril de 2008

A História de SAMBA TRISTE

Por Billy Blanco
Certo entardecer, me aparece no [número] 101 da [Rua] Raul Pompéia, 186, Posto 6, Copacabana, Rio de Janeiro, uma figura de "sabagante valetudinário" (homem de compleição pequena), expressão que era usada carinhosamente por um imortal cujo o nome não me ocorre se referindo ao Grande Otelo.
O dito personagem, que em talento era muito maior que um Golias já naquela época, se chama Baden Powell de Aquino. Segundo ele, por pouco que o primeiro nome não era Robert, para xará total e absoluto do lorde inglês fundador do escotismo. Acontece que papai Aquino era chefe escoteiro fanático.
Badinho, dezoito anos, novinho, cheirando a tinta, que só tomava guaraná, me mostra um samba, que naquele ano de 1957 já era Bossa Nova. E me pede uma letra.
-Que nome você deu ao samba?
-Samba Triste, mas pode mudar se quiser fazer outro tema de letra.
-Não, está lindo o nome!
Então trabalhamos em cima do título e acabamos o samba.
Se o Baden tivesse passado antes na casa do Vinicius, a letra teria ficado melhor, tenho certeza.
Mas graças a Deus ele não conhecia ainda o Vinicius, e essa [letra de música] me dá um trocado federal, estadual, municipal e internacional até hoje.

Billy Blanco é músico e compositor, parceiro e compadre de Baden Powell.

Leila Pinheiro canta Samba Triste, acompanhada por Marcel Powell (filho de Baden) no concerto de 26 de janeiro de 2007, na Sala Cecília Meireles, no Rio de Janeiro.


Veja aqui o Mestre arrebentando num show para uma platéia colossal na Europa, na década de 1960.

terça-feira, 25 de março de 2008

Um belo samba na velocidade de um raio

Estou devendo a história do Baden Powell arrancar seu parceiro letrista Paulo Cesar Pinheiro do sofá da sala para a poltrona do avião. Mas, como estamos com o vídeo do ensaio do recital no Teatro Bela Vista (acima, à esquerda), vou contar um caso daquela temporada. Paulinho veio do Rio para São Paulo, assistir o show. Ao vê-lo no teatro, Baden puxou-o para um canto. - Terminei de fazer um samba agora. Se você botar a letra, dá tempo de cantar na segunda parte do show – disparou o vigoroso violonista. - Mas preciso do tempo pra decorar a música, bolar as frases... – argumentou o poeta. - Presta atenção – disse Baden, e passou a cantar a melodia incontáveis vezes, até que foi acionado ao palco. O show rolando lá em cima, e Paulinho Cesar Pinheiro confinado no camarim, às voltas com os versos de uma canção recém-concebida. No intervalo, um implacável Baden abordou o parceiro. Mal deu tempo de Paulinho entregar-lhe a letra num papel, e lá se foi o violonista imortal enfeitiçar o público com seu violão imenso. O samba chama-se Até Eu: Até eu, quando o assunto é de ter paixão Faço o que recomenda a tradição Carinho é coisa de primeira mão. Mas, você sendo poeta, tinha de saber Até eu, quando se trata de amor Eu sou mais eu... Não é que eu esteja de má-fé Mas, você, sendo mulher, Devia ser mais cordial Isso eu acho tão normal Mas você vive estudando pra saber... Na vida não se estuda pra aprender. É preciso viver! No link abaixo, você encontra minúsculas amostras-grátis de duas versões do samba: uma na voz do próprio Baden, e outra na vocalização da suprema Janine de Waleyne. Ouça, e saia enlouquecido por aí, para comprá-las. http://www.discosdobrasil.com.br/discosdobrasil/consulta/detalhe.php?Id_Musica=MU004878

sábado, 22 de março de 2008

Paulinho relembra doideiras do amigo genial

Na última segunda-feira, 17 de março, li no Estadão que o compositor Paulo César Pinheiro contraiu dengue.
Mas não foi esta notícia que me deixou na aflição em que me encontro. Os deuses não deixam que gênios da nossa raça sucumbam à incúria das (des)autoridades.
Este sentimento invadiu minha alma porque, naquele mesmo dia, meu amigo Ary Marcos Pero Gonçalves da Motta, do Refúgio do Sambista, me avisou: “Nosso próximo Tributo [os dois anteriores foram para Eduardo Gudin e Candeia] vai ser pro Paulinho César Pinheiro”.
Por isto aqui estou me roendo: com que mão se cumprimenta um deus? Com que palavras ou gestos, certamente insanos, se pode agradecer ao monumental poeta que mais fez letras para a música brasileira? – há proposta de incluí-lo no Guinness Book por suas 900 músicas gravadas, dentre mais de 1.500 compostas e umas 600 esperando a vez.
Para desbaratinar o tormento prévio pelo indelével encontro, resgato alguns depoimentos do Paulinho sobre sua convivência com o Baden. São livres reproduções de uma bela matéria de um jornal do Nordeste, e da colossal entrevista de Luiza Nascimento para A Nova Democracia.
“O Baden Powell era um cara muito doido”, sintetiza Paulo César Pinheiro. Eles se conheceram quando Paulinho tinha 14 anos, e Baden, 26. Ambos moravam em São Cristóvão, no Rio. Todavia, o primeiro encontro deu-se no batizado de uma sobrinha de Baden, no bairro Olaria. “Foi minha primeira noite fora de casa”, lembra o poeta. Naquele fase adolescente Paulo era parceiro do também violonista João de Aquino, primo de Baden.
A amizade se firmou, e Baden, já famoso na época, passou a levar o garoto em suas andanças noturnas. “Ele me buscava em casa. Meu pai achava que música era coisa de vagabundo; só me deixava sair porque era com o Baden Powell”, conta.
Até os 20 e poucos anos Baden só bebia guaraná. Quem o levou para as noitadas etílicas foi Vinícius de Moraes. Agora, ele fazia o mesmo com Paulinho.
O garoto já assombrava pelo talento precoce. Impossível não se espantar com um menino que, com apenas 14 anos, escreveu “Oh, tristeza me desculpe, / Estou de malas prontas, / Hoje a poesia veio ao meu encontro, / Já raiou o dia, vamos viajar! / Vamos indo de carona, / Na garupa leve do vento macio, / Que vem caminhando, / Desde muito longe, lá do fim do mar...” (Viagem, com João de Aquino).
Mais espantoso é que Paulinho era um péssimo aluno de Português até então. Um dia, durante as férias escolares em Angra dos Reis, ele foi acometido do que em Literatura chamamos “estalo de Vieira” (referente ao Padre Antonio Vieira, maior sermonista da nossa língua; o termo aplica-se à compulsão irrefreável por escrever).
Dois anos depois do primeiro encontro, Baden intimou seu amiguinho de boemia: “Tá na hora da gente compor alguma coisa juntos.” Assim. Na lata. O moleque se arrepiou. Baden era parceiro de Vinícius de Moraes!!! “Fiquei com medo, mas o Baden insistiu e eu topei, apesar de todo o peso que senti”, diz Paulinho.
E não é que o garotão de 16 anos incompletos entrou com a mão direita no universo imenso do violão imortal de Baden? Sente só:
Vai, meu lamento, vai contar
Toda tristeza de viver
Ai!, a verdade sempre trai
E às vezes traz um mal a mais.
Ai!, só me fez dilacerar
Ver tanta gente se entregar
Mas não me conformei
Indo contra lei
Sei que não me arrependi
Tenho um pedido só
Último talvez, antes de partir:
Quando eu morrer me enterre na Lapinha,
Calça, culote, paletó almofadinha

“Tudo com o Baden era assim. Ele chegava de repente com suas idéias fervendo na cabeça, e a gente tinha de seguir suas doideiras”, conta Paulinho com um sorriso nostálgico nos lábios.
Feito aquela vez em que o poeta estava sossegado em sua casa, quando um esbaforido Baden Powell irrompe porta adentro:
- Me dá a sua carteira de identidade aí!
- Pra quê? – espantou-se Paulinho.
- Você vai pra França comigo.
- Hãããã!!!
Mas este caso fica pra outra hora...

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Baden Powell revisita afro-sambas

O disco Os Afro-Sambas foi gravado em 1990 e lançado na França, mas só agora está ao alcance do público no Brasil
Por Lauro Lisboa Garcia

(Publicada n’O Estado de São Paulo, 26.fev.2008)
Os geniais afro-sambas de Baden Powell e Vinicius de Moraes estão mais uma vez na roda. Regravados por Mônica Salmaso e Paulo Bellinati em 1996 e por Virginia Rodrigues em 2003, eles voltam pelas mãos do sublime violonista que levou o poeta a descobrir os encantos do candomblé e da capoeira da Bahia em 1962. A versão em pauta, Os Afro-Sambas (Biscoito Fino) data de 1990, foi lançada na França (onde o CD com 11 faixas, 3 a mais que o original, foi masterizado), e só agora está ao alcance do público no Brasil. Antes o projeto foi às mãos de poucos, como brinde de um banco.
Fazia então dez anos que Vinicius tinha morrido, mas o Quarteto em Cy, que imprimiu seu vocal na gravação original, realizada entre 1965 e 1966, se reencontrou com Baden para participar de oito faixas. Dentre as mais de 20 canções que a dupla compôs com essa temática, há os clássicos Canto de Ossanha e Labareda, que fizeram parte do LP original dos afro-sambas. Baden também faz variações sobre Berimbau nesta revisita.
Depois que virou evangélico, Baden renegou sua obra-prima com Vinicius. Por sorte, ele as reinventou nessa empreitada, em mais um mergulho profundo nos mistérios dos ritos afro-brasileiros e seus orixás. A voz é pequena (e as "meninas" do Quarteto em Cy compensam), mas o violão fala por ele, percussivo, sofisticado, contundente, em arpejos vigorosos. Baden ainda regravaria outros clássicos da dupla, como Consolação e Samba da Bênção seis meses antes de morrer em 2000. O registro está no álbum Baden Plays Vinicius, lançado em 2007, um melancólico, solitário e pungente toque de adeus, igualmente imprescindível.
No CD dos afro-sambas, além do Quarteto em Cy, ele está acompanhado de uma banda de baixo, bateria, flauta e percussão. O encarte traz a reprodução de uma carta que Baden enviou a um tal Joel, explicando por que queria regravar esses temas: a qualidade sonora, disse ele, "era a pior naquele tempo" (anos 60), "só existiam dois canais em hi-fi". Ele lembra também que nos dias de gravação caiu um "temporal histórico" e que ele e Vinicius estavam encharcados mesmo era de uísque e cerveja. Tocavam e cantavam "com muita raça, mas também bastante bêbados".
Alguns desses afro-sambas estão no roteiro dos shows que Fabiana Cozza e Max de Castro fazem juntos de sexta a domingo no Sesc Vila Mariana.
Saravá!

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Filho de peixe...

Na próxima 5ª-feira vou assistir o show do violonista Marcel Powell. Filho do meu idolatrado Baden Powell. (Veja na seção de vídeo, Marcel e seu pai na composição Interrogando, de João Pernambuco.)
Dizem que Marcel herdou do pai o domínio sobre o violão. Não é verdade. Baden foi e será sempre único, o maior violonista do planeta.
Mas levarei meu aplauso e meu abraço a este jovem talento das cordas brasileiras.
Marcel reprocessa com inteligência e sensibilidade a tradição violonística brasileira iniciada por mestres como Dilermano Reis, Garoto, João Pernambuco e universalizada por seu pai Baden Powell.
O repertório inclui seu último CD Aperto de Mão, passando pelo samba, choro, frevo e clássicos do jazz e músicas como Último Desejo (Noel Rosa), Desenho de Giz (João Bosco e Abel Silva), Essa Maré (Ivan Lins e Ronaldo M. Souza) e Round’bout midnight do pianista Thelonious Monk.
SESC Pinheiros - Duração: 1h20. Auditório - 3º andar (capacidade para 100 pessoas). Não é permitida a entrada após o início do espetáculo.
Ingressos: R$ 12,00 [inteira]
R$ 6,00 [usuário matriculado no SESC e dependentes]
R$ 3,00 [trabalhador no comércio e serviços matriculado no SESC e dependentes]
Rua Paes Leme, 195. Tel. 3095-9400

quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Baden no bairro boêmio: a "Manhã" durava uma noite inteira

Em 1962, estava tudo pronto para Baden Powell ir aos EUA, na sua primeira viagem fora do Brasil. No entanto, seu pai Lilo de Aquino, sapateiro e músico amador, adoeceu, e Baden desistiu de partir.
Quando o pai faleceu, Baden trocou a passagem Rio-New York pela Rio-Paris, por sugestão de seu recente parceiro Vinícius de Moraes.
Ele desembarcou na Cidade Luz com poucos dólares no bolso. Não tinha grandes contatos no meio artístico parisiense. Só tinha a cara, a coragem, e o violão debaixo do braço.
Foi ganhar a vida tocando em casas noturnas do Quartier Latin, bairro boêmio da capital francesa. Os bares e restaurantes lotavam para ver aquele moreno brasileiro tirar um som de seu violão como jamais haviam ouvido.
Certa noite, Baden estava conversando com seu amigo Pierre Barrouh: “Vou voltar pro Brasil”, disse Baden. “Não está gostando daqui? Vê toda esta gente? Eles fazem fila todas as noites pra te ouvir!!!”, retrucou Pierre. “Meu visto de permanência na França está acabando”, revelou Baden.
Pierre usou de todos os seus recursos como compositor, ator e cineasta, e arrumou para Baden fazer a primeira parte do show do cantor Jacques Brel, no refinado teatro Olympia de Paris. O público esperava só samba-carnaval daquele violão mulato. Mas entre os sons do Brasil também fluíram obras de Bach, Chopin e Ravel. O imenso violão de Baden combinava profunda base erudita com o balanço e a melodia de apelo popular, entremeado pelo alto poder de improvisação herdado do jazz e do chorinho. Na hora do bis, teve de voltar 8 vezes ao palco.
Aquela noite marcou o início de uma sólida convivência de Baden e a capital da França, onde ele viveu por 20 anos. Um de seus grandes sucessos na Europa era sua interpretação para Manhã de Carnaval, de seu amigo violonista Luiz Bonfá, em parceria com Antonio Maria, jornalista e poeta pernambucano radicado no Rio. Além de ser uma das mais belas canções produzida por um ser humano, Manhã de Carnaval ganhou dezenas de versões diferentes no violão de Baden. É um destes arranjos que você vai ver-ouvir no vídeo abaixo.

Antes de você iniciar a audição, vou te contar rapidinho como Baden e seu violão enfeitiçavam o público, em suas apresentações madrugada adentro.
A cada duas músicas, Baden tocava Manhã de Carnaval de um jeito diferente. Além de se extasiar com as novas canções exibidas, o ouvinte ficava curioso para conhecer o novo arranjo para aquela mesma magnífica canção.